Reunião no Palácio da Alvorada resultou na criação do comitê da Covid-19, que marca a união entre os três poderes no combate à pandemia.| Foto: Evaristo Sá/AFP
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No dia em que o Brasil atingiu a marca de 300 mil óbitos causados pelo novo coronavírus, o anúncio da criação de um comitê para acompanhamento da pandemia e a mudança de discurso do presidente Jair Bolsonaro amenizaram, ao menos no primeiro instante, a pressão política sobre o Executivo, segundo interlocutores do Palácio do Planalto. Apesar disso, nos bastidores, alguns parlamentares se mantêm céticos e esperam por medidas práticas para avaliar melhor as ações do comitê da Covid-19.

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“Ficou claro que o espírito de união nacional e esperança fará com que vençamos esse mal. Agora é implementar todas as medidas acordadas. Salvar vidas é crucial nesse momento”, comentou o ministro Luiz Eduardo Ramos, responsável pela articulação do governo com o Congresso. Na mesma linha, o ministro das Comunicações, Fábio Farias, afirmou que o foco será na ampliação da vacinação. “Reunião entre poderes com clima de total harmonia, respeito e cooperação. Foco total no aumento da capacidade diária de vacinação”, disse.

A sinalização de Bolsonaro e de integrantes do governo foi recebida com ceticismo principalmente por parte do Congresso Nacional. Diante do descontrole da pandemia, da alta taxa de mortalidade e da falta de vacinas, os parlamentares estavam pressionando o Palácio do Planalto e já ameaçavam travar a tramitação de matérias de interesse do Executivo, como as reformas administrativa e tributária.

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Logo após o encontro que ocorreu nesta quarta-feira (24) no Palácio da Alvorada e reuniu representantes dos três poderes, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), afirmou que na reunião de líderes iria tentar acordo para votação dos projetos que tratassem da pandemia. Entre os textos, existe a expectativa de votação de um texto que trate da contratação de leitos de unidades de terapias intensivas (UTI) e da compra de ventiladores pulmonares pelos empresários para doação ao Sistema Único de Saúde (SUS).

Como contrapartida, os setores empresariais teriam incentivos fiscais, como a dedução no Imposto de Renda. O deputado Luizinho (PP-RJ), que chegou a ser cotado para substituir Eduardo Pazuello no Ministério da Saúde, ficou incumbido de criar a proposta.

Para o líder do DEM na Câmara, o deputado Efraim Filho (PB), o comitê da Covid-19 será essencial para o gerenciamento da crise e para trazer mais transparência para a gestão do Ministério da Saúde. “Hoje há muitos ruídos e desinformação. Então um comitê que traga informações sobre números de vacinas, primeira dose, segunda dose, insumos, kit intubação e previsibilidade poderá acalmar a população e apontar um rota de saída dessa crise”, argumentou.

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Parlamentares criticam demora de um ano para criar comitê da Covid-19

O deputado Kim Kataguiri (DEM-SP) criticou a demora que o governo teve para criação do comitê da Covid-19. “Precisaram morrer 300 mil pessoas de Covid, mais de um ano de pandemia, o mundo ver o Brasil como desastre, carta aberta do mercado financeiro e todos os poderes pressionarem para Bolsonaro criar um comitê semanal para enfrentar o coronavírus. Bolsonaro não fez isso antes porque não queria admitir que ele é responsável pelo país que governa”, disse.

Na mesma linha, o deputado Fábio Trad (PSD-MS) argumentou dizendo que a medida deveria ter sido tomada há um ano. “Nunca é tarde para a convergência política dos poderes e das forças políticas no enfrentamento à pandemia, mas não tem como deixar de imaginar quanta vidas seriam poupadas se essa iniciativa do presidente fosse tomada em março do ano passado”, ponderou.

Na oposição, a deputada Gleisi Hoffmann (PT-RS) relembrou que, no último dia 10 de março, após decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que tornou o ex-presidente Lula (PT) elegível, o petista afirmou que "um presidente que respeitasse o país teria criado um comitê de crise". “Governo Bolsonaro em conjunto com os demais poderes e Ministério da Saúde vão instalar comitê de enfrentamento à pandemia. O mesmo que Lula defendeu criar na semana passada. Nada como um estadista para pressionar o governo a trabalhar. Efeito Lula a todo vapor!”, disparou a petista em suas redes sociais.

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Municípios reclamam de ausência em reunião

A ausência de representantes dos municípios na reunião que criou o comitê da Covid-19 foi motivo de críticas das duas principais entidades que representam prefeitos no país. O motivo do desconforto, segundo a Confederação Nacional dos Municípios (CNM) e a Frente Nacional dos Prefeitos (FNP), é que as prefeituras são responsáveis pela aplicação das vacinas contra a Covid-19 e por boa parte do atendimento básico de saúde aos infectados pelo novo coronavírus.

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Segundo o consultor da CNM para estudos técnicos, Eduardo Stranz o anúncio do comitê foi recebido com cautela, pois ainda não se sabe se será de fato eficaz. A CNM reclamava da falta de um interlocutor federal para coordenar as demandas dos municípios em meio à crise sanitária — responsabilidade que, segundo a entidade, não foi assumida pelo Ministério da Saúde.

"Houve demora e, ao mesmo tempo, se perdeu a oportunidade de contar com mais um ente federado (na reunião), que é o principal desse trio entre a União, Estados e municípios", disse Stranz, porta-voz da confederação, ao jornal O Estado de São Paulo. "Ter uma instância, mesmo que seja um comitê, à qual se possa direcionar nossos pleitos e questionar as alternativas, é salutar. Se vai funcionar, só o tempo dirá. São pontos de vista diferentes na mesma mesa, é preciso ter uma capacidade de diálogo."

Já a FNP divulgou uma nota em que classifica a ausência de prefeitos na reunião como "federalismo de conveniência". "O presidente da República reuniu alguns governadores, os presidentes da Câmara, do Senado e do Supremo Tribunal Federal para tratar da pandemia e não convidou prefeitas e prefeitos, que são os responsáveis pela aplicação das vacinas. Essa parece ser uma ideia de federalismo de conveniência", escreveu a FNP. A entidade afirma que "o Brasil e os brasileiros estão abandonados pelo governo federal".

Interlocução com os governadores será pelo presidente do Senado

Na criação do comitê da Covid-19, o presidente Bolsonaro afirmou que o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), será o interlocutor entre governadores e o Ministério da Saúde para a elaboração das medidas de contenção da pandemia. O parlamentar, que foi eleito presidente do Congresso no começo deste ano com apoio do Planalto, vinha sendo pressionado a tomar medidas mais duras contra o Executivo diante do descontrole da pandemia e nos últimos dias passou a cobrar Bolsonaro por medidas mais efetivas na gestão da Saúde.

A disputa entre Bolsonaro e os governos estaduais vem desde o início da pandemia e desde então era o maior entrave na gestão das medidas de isolamento, por exemplo. Apesar dessa sinalização, apenas seis governadores mais próximos ao governo estiveram presentes nesse primeiro encontro.

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Segundo os presentes na reunião, os pontos de convergências foram: necessidade de vacinação em massa e que as medidas que forem tomadas pelo Ministério da Saúde sejam com base em dados científicos. Além disso, Bolsonaro voltou a levantar o debate do tratamento precoce e apresentou resistências às medidas de lockdown.

De acordo com o governador do Rio de Janeiro, Claudio Castro (PSC), o fim da politização da pandemia foi debatido. Além disso, a maioria dos presentes concordou com o isolamento social, mas não houve consenso sobre a intensidade desse isolamento.

“Tudo está muito polarizado e politizado. Muito se fala em tratamento e diagnóstico precoces, mas todas essas questões têm que passar por um debate menos político e mais técnico”, defendeu Castro.

Apesar dessa sinalização, governadores que não estiveram na reunião criticaram o governo federal. Antagonista de Bolsonaro, o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), afirmou que o comitê seria um grupo de “adulação” do presidente.

“O Brasil quer vacinação, não quer comitê de adulação. Comitê de adulação não participo. Faça um comitê de vacinação e serei o primeiro a estar lá presente para ajudar. Para fazer adulação de presidente, não”, disse o tucano, que completou afirmando que o grupo não representava os paulistas, tendo em vista que o seu governo não havia sido convidado. Na mesma linha, o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), afirmou que o foco da reunião tinha como preocupação apenas com “fotos e manchetes”.

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Agora, existe a expectativa de que Rodrigo Pacheco reúna todos os governadores na sexta-feira (26) para alinhar as demandas junto ao Ministério da Saúde.

Comitê da Covid-19 ofusca pedido de CPI

Com a criação do comitê, Pacheco tenta postergar a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar o governo Bolsonaro na condução da pandemia. O requerimento já atingiu o número mínimo de assinaturas entre os senadores, mas ainda depende do aval do presidente do Senado.

Entusiasta da investigação, o senador Fabiano Contarato (Rede-ES) manteve seu posicionamento. “Precisamos apurar e dar a atribuição da responsabilidade civil, administrativa e criminal para quem, de qualquer forma, tenha concorrido para essa pandemia. A CPI vai trazer transparência e seriedade para essa situação de calamidade”, defendeu o senador.

Nesta semana, a líder da bancada feminina, senadora Simone Tebet (MDB-MS), também voltou a cobrar Pacheco. "Se nós não tivermos uma mudança de posicionamento do presidente da República, nós estaremos engrossando o coro a favor da CPI da pandemia. Não é possível mais. Há um limite entre a omissão e a prevaricação. A prevaricação passa a ser crime", defendeu.

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