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O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e o presidente Jair Bolsonaro: relação entre governo e Congresso não sofrerá impactos por decisão do STF sobre as emendas de relator| Foto: Marcos Correa/Presidência da República

A decisão da ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), em suspender temporariamente a execução das chamadas emendas de relator, não tem potencial para desgastar a relação entre o Congresso e o governo, segundo avaliação de parlamentares da base governista. A liberação desses recursos virou uma espécie de moeda de troca para que deputados e senadores aprovem propostas legislativas de interesse do governo.

A negociação e a liberação desses recursos — tecnicamente chamados de emendas do identificador de resultado primário nº 9 (RP9) — para congressistas aliados se tornou um modus operandi em votações mais polêmicas e de difícil aprovação, a ponto de criar uma dependência desse instrumento sobretudo nesta reta final do ano legislativo.

A decisão de Weber — que ainda nesta semana será chancelada ou derrubada pelo plenário virtual do STF — às vésperas da votação do segundo turno da chamada PEC dos Precatórios causou um constrangimento na Praça dos Três Poderes, mas insuficiente para abalar o relacionamento entre o governo e o Congresso.

A Gazeta do Povo ouviu de líderes partidários e outras lideranças da Câmara que a decisão pode causar um desgaste pontual junto a alguns congressistas, mas não tem potencial para impactar a relação entre o Executivo e o Legislativo federal, nem comprometer a votação de projetos de interesse do Palácio do Planalto. A leitura é partilhada por interlocutores palacianos.

Por que a suspensão das emendas de relator não impacta a relação

Alguns motivos levam as lideranças ouvidas pela reportagem a crer que a relação entre Planalto e Parlamento não será impactada pela decisão de Rosa Weber. Uma das causas é a própria agenda de votações. A análise é de que a PEC dos Precatórios será a última pauta polêmica a ser votada neste ano.

"Vai passar a PEC dos Precatórios e só, acabou votação agora. Não vai ter nem [reforma] tributária, administrativa, não tem mais nada para frente, ninguém vai mais arrumar confusão na Câmara e Senado. Mesmo [a reforma do] Imposto de Renda deve ficar para o primeiro ano do novo mandato. Daqui para frente é só pauta amiga, tranquila", analisa um vice-líder da base do governo.

Alguns parlamentares afirmam que o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), deseja colocar em pauta a proposta de emenda à Constituição (PEC) 32/2020, a reforma administrativa, mas mesmo interlocutores do Planalto admitem não dispor dos 308 votos para aprová-la em dois turnos. "É uma pauta muito confusa, sofre lobby contrário de várias categorias, todo mundo é candidato no próximo ano, ninguém vai enfrentar isso agora", diz um assessor palaciano.

A Gazeta do Povo informou em outubro que Lira sondou deputados com uma proposta de R$ 20 milhões em emendas de relator por cada voto favorável à reforma administrativa, mas declinaria a depender da rejeição da base à pauta e das dificuldades em aprovar a PEC dos Precatórios, que, segundo afirmou o deputado Celso Maldaner (MDB-SC), o governo teria oferecido R$ 15 milhões a cada parlamentar que votasse favoravelmente.

Outro motivo que leva lideranças do Congresso a não acreditar em um desgaste na relação com o governo é o fato de o Planalto ter poder mínimo sobre as negociações. "[A relação] não fica abalada porque não é o presidente [Jair Bolsonaro] quem comanda, os parlamentares sabem disso. Quem comanda é o presidente da Casa [Arthur Lira], então, toda essa coragem do Arthur em botar matérias desse nível para votar é em cima desse poder que ele tem", diz um vice-líder de um partido que integra o Centrão na Câmara.

Na Câmara, as RP9 são negociadas entre Lira e o relator-geral do Orçamento — que, em 2021, foi o senador Márcio Bittar (MDB-AC) —, mas também passam pelo crivo do Planalto. "No fim, quem vai pagar é o governo, então, depende dessa aprovação, mas, em geral, o peso maior fica sobre o Arthur", sustenta um interlocutor palaciano. "É mais fácil ter um desgaste entre o Parlamento e o Supremo do que entre o Congresso e o governo", complementa.

O que Lira tem feito para mitigar impactos do STF sobre as emendas

Apesar da confiança de que, no geral, o relacionamento entre Executivo e Legislativo não será alterado, o presidente da Câmara se articulou para evitar impactos. Nesta segunda-feira (8), Lira enviou ao STF uma manifestação em que defende a revogação integral da liminar da ministra Rosa Weber.

Lira também se reuniu na tarde desta segunda com o presidente do STF, Luiz Fux, para tratar sobre a liminar de Weber. O presidente da Câmara sustentou que o tema cabe ao Congresso Nacional legislar e que a Suprema Corte não deve interferir sobre o assunto.

Os movimentos de Lira são vistos por lideranças da Câmara como uma estratégia para mitigar possíveis impactos. "A minha opinião de que a liminar não afeta a relação macro entre o governo e o Congresso não evita, a nível micro, ruídos e estresses por conta dos compromissos", diz um vice-líder alinhado ao presidente. "Tem muito deputado que já avisou prefeitos que estaria mandando os recursos. Se o dinheiro não chega, pode ter alguma cobrança", explica.

Parte da estratégia de Lira consiste até mesmo pautar a PEC dos Precatórios somente após o julgamento do STF, diz um vice-líder de uma legenda do Centrão. Existe um temor do presidente da Câmara de que a Suprema Corte chancele a liminar e obrigue uma ampla transparência sobre as emendas de relator. Caso isso aconteça, corre-se o risco de causar constrangimentos na base.

"O problema não é a RP9, o problema maior é que a Rosa Weber está colocando essa questão de transparência. Aí, como seria? Um parlamentar saberia o quanto o outro ganhou e ficaria: 'pô, por que eu recebi tanto e o outro recebeu 10 vezes mais?'. Esse que é o problema", diz uma liderança do Centrão. "[A RP9] não é uma coisa igualitária, isso que seria um problema", complementa.

Outro motivo que pode gerar constrangimento ao governo caso o STF determine uma ampla transparência sobre as emendas de relator é o risco de se tornar conhecimento público a liberação de recursos até mesmo para partidos de oposição. "O problema é que você vai ter deputados de esquerda que receberam. O PDT, por exemplo, por que você acha que fez aquela graça?", comenta uma liderança do Centrão sobre os 15 votos de pedetistas à PEC dos Precatórios, acima da metade dos 24 deputados do partido.

Bolsonaro e Senado acompanharam movimento de Arthur Lira

O movimento político adotado por Arthur Lira de defender a legalidade das emendas de relator não foi isolado e veio acompanhado pelo Senado e por Bolsonaro. O presidente da República negou que tenha barganhado emendas no Congresso e afirmou que os argumentos usados pela ministra Rosa Weber são injustos.

“Os argumentos usados pela relatora do Supremo não são justos, dizer que nós estamos barganhando. Como posso barganhar se quem é o dono da caneta é o relator, um parlamentar? E não é [orçamento] secreto porque está no Diário Oficial da União”, afirmou Bolsonaro em entrevista à rádio Jovem Pan de Curitiba nesta segunda-feira (8).

A Advocacia do Senado também agiu, defendendo no STF a revogação da decisão que suspendeu o pagamento das emendas de relator. O Senado argumentou que suspender os pagamentos leva a "paralisação de um número — até o momento — incalculável de obras e serviços, muitos deles vinculados à saúde, à educação e à segurança pública".

O líder do PSL na Câmara, Vitor Hugo (GO), vai na mesma linha da Advocacia do Senado ao defender a legalidade das emendas de relator. "Isso perturba um pouco o país, porque as emendas de relator trilham na ponta da linha pagando custeio de hospitais, de entidades do terceiro setor ligadas a comunidades, e também na aquisição de equipamentos. Paralisar as emendas de relator é paralisar o país na sua relação entre o Executivo, prefeituras e entidades", destaca o deputado à Gazeta do Povo.

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