Encontre matérias e conteúdos da Gazeta do Povo
Relação entre Poderes

Congresso já fez Bolsonaro de “rainha da Inglaterra” por 9 vezes; e isso pode se repetir

Os projetos de Bolsonaro que foram barrados pelo Congresso em 2019
Jair Bolsonaro discursa em sua posse no Congresso: parlamentares derrubaram série de propostas do presidente em 2019. (Foto: José Cruz/Agência Brasil)

Ouça este conteúdo

O presidente Jair Bolsonaro reclamou no ano passado que o Congresso queria torná-lo uma espécie de "rainha da Inglaterra" – que, por causa do sistema parlamentarista britânico, reina mas não governa. A declaração foi dada em 22 de junho, quando Bolsonaro anunciou que iria vetar o trecho do projeto do Legislativo que transferia do presidente para os parlamentares o poder de fazer indicações para agências reguladoras.

Não foi a única vez que Câmara e Senado assumiram o protagonismo legislativo, ao mesmo tempo em que o presidente reduzia a participação dos parlamentares na indicação de aliados para cargos no governo. Em 2019, o Congresso buscou controlar a pauta legislativa, barrou iniciativas do Executivo e encaminhou seus próprios projetos em questões caras para o governo. E isso pode se repetir a partir de agora, quando o Congresso retoma seus trabalhos após o fim do recesso parlamentar.

Além do projeto das agências reguladoras, a Gazeta do Povo listou outras oito situações em que o Congresso tomou decisões por conta própria e fez Bolsonaro de "rainha da Inglaterra". A reportagem também traz outras três situações em que isso pode voltar a ocorrer em 2020.

Casos em que o Congresso fez Bolsonaro de rainha da Inglaterra em 2019

1. Decreto das armas

Uma das principais bandeiras da campanha de Jair Bolsonaro, a flexibilização das regras para aquisição, posse e porte de armas virou novela. Depois de determinar por decreto a alteração da legislação, aumentando o rol de pessoas que poderiam pedir o porte e ampliando a posse na área rural, o governo viu sua medida ser rejeitada pelo Senado. O Planalto então recuou, revogou seu próprio decreto e editou outros três sem os pontos considerados polêmicos. Também apresentou um projeto de lei para que as propostas excluídas dos novos decretos fossem discutidas no Congresso.

VEJA TAMBÉM:

2. Demarcação de terras indígenas

Outra proposta cara a Bolsonaro que empacou por causa do Congresso foi a transferência da responsabilidade pela demarcação de terras indígenas da Fundação Nacional do Índio (Funai) para o Ministério da Agricultura. A primeira tentativa, por meio da Medida Provisória (MP) 870, foi rejeitada em maio, quando o Legislativo determinou que a demarcação retornasse à Funai, e que a Funai voltasse a estar subordinado ao Ministério da Justiça (a MP estabeleceu a transferência do órgão para a Agricultura).

O presidente enviou nova MP em junho determinando novamente que a demarcação das terras indígenas fosse submetida à pasta da Agricultura. Mas o Senado devolveu a medida provisória, sem apreciá-la, argumentando que a Constituição impede que uma MP rejeitada seja reeditada no mesmo ano. A medida provisória também foi derrubada liminarmente pelo Supremo Tribunal Federal.

3. Abuso de autoridade

Eleito com o discurso de combate à corrupção e de apoio à Lava Jato, Bolsonaro viu (sem ter muito o que fazer) o Senado desengavetar e aprovar o projeto de lei que pune o abuso de autoridade por parte de integrantes do Judiciário, do Ministério Público e das polícias. A proposta, que já havia sido aprovada na Câmara durante o governo do ex-presidente Michel Temer, era criticada por integrantes da Lava Jato e pelo ministro Sergio Moro. Segundo eles, o projeto cria constrangimento para juízes, promotores, procuradores e policiais investigarem e punirem corruptos. Bolsonaro vetou 33 dispositivos do projeto. Mas 18 vetos foram derrubados pelo Parlamento.

4. Transferência do Coaf para Moro

Uma das exigências do ex-juiz Sergio Moro para assumir o Ministério da Justiça e Segurança Pública era ter sob sua responsabilidade o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) – que até o governo Temer era subordinado ao Ministério da Fazenda. A transferência foi contemplada na proposta de reforma administrativa enviada por Bolsonaro ao Congresso. Mas deputados e senadores barraram a mudança e mantiveram o Coaf no Ministério da Economia, que sucedeu o Ministério da Fazenda. Mais adiante, o próprio Bolsonaro decidiu transferir o Coaf para o Banco Central. Desta vez o Congresso aprovou a proposta do governo.

5. Excludente de ilicitude

O excludente de ilicitude – mecanismo para impedir a punição de policiais que matam no exercício de sua função – foi uma das promessas de campanha de Bolsonaro. A proposta foi incluída pelo ministro da Justiça, Sergio Moro, no pacote anticrime que enviou ao Congresso. Mas o dispositivo foi retirada do projeto pelos deputados antes mesmo de chegar ao plenário. O pacote de Moro, aliás, perdeu uma série de outros pontos propostos pelo governo e viu ser incluído nele propostas que não faziam parte do projeto original – tal como a criação do juiz de garantias.

6. Orçamento impositivo das emendas do Congresso

Um dos objetivos do governo Bolsonaro é desengessar o orçamento para ter maior autonomia e flexibilidade no uso de recursos públicos. Mas, exatamente no sentido contrário, o Congresso tirou da gaveta em 2019 uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que estava parada desde 2015 e aprovou a ampliação do chamado orçamento impositivo. Com a mudança, o governo passou a ser obrigado a executar todas as emendas parlamentares ao orçamento e não só as emendas individuais, como ocorria anteriormente. A medida obriga o governo a executar todas as emendas das bancadas estaduais no Congresso – que somam cerca de R$ 3 bilhões por ano.

7. Fim da obrigação de publicar balanço em jornais impressos

A medida provisória do presidente Jair Bolsonaro que desobrigava empresas de publicar seus balanços em jornais impressos perdeu a validade sem que o Congresso a apreciasse. A decisão dos parlamentares de não votar a MP foi deliberada. Na comissão mista do Congresso que analisou a medida provisória, a maioria dos parlamentares foi contra. No entendimento de grande parte dos congressistas, a MP era parte da briga do presidente com parte da imprensa. Como a publicação dos balanços é uma fonte de receita para os jornais, a desobrigação afetaria as finanças de veículos de comunicação.

8. Sigilo das informações

Uma das primeiras medidas do governo Bolsonaro, editada ainda em janeiro de 2019, sofreu revés na Câmara. O decreto que ampliava o rol de autoridades que poderia classificar documentos oficiais como secretos (15 anos de sigilo) e ultrassecretos (25 anos de sigilo) foi rejeitado pela Câmara. Bolsonaro revogou a proposta antes de ela ser discutida pelo Senado.

Propostas de Bolsonaro que podem ser ignoradas pelo Congresso em 2020

1. Reforma tributária: do Congresso ou do governo?

O governo Bolsonaro prometeu ao longo de 2019 enviar ao Congresso um projeto de reforma tributária. Mas, até agora, não apresentou sua proposta – embora assegure que vai fazer isso em breve. Enquanto isso, Câmara e o Senado já estão discutindo seus próprios projetos para mudar o sistema de cobrança de impostos no país. A proposta da Câmara teve até o apoio da oposição e passou rapidamente na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).

2. Fim do monopólio da UNE na confecção da carteira estudantil

A Medida Provisória 895, editada por Bolsonaro em 6 de setembro, criou a Carteirinha de Estudante Digital e acabou com o monopólio da União Nacional dos Estudantes (UNE) na emissão do documento. A MP determina que qualquer estudante pode solicitar sua identificação estudantil por meio de aplicativos disponíveis em lojas virtuais e passa a ter direito, a custo zero, a uma carteirinha que pode ser usada para solicitar, por exemplo, a meia-entrada em eventos culturais e esportivos.

A mudança, contudo, possivelmente não terá vida longa. Em princípio, Câmara e Senado não vão apreciar a MP 895 – nem sequer iniciaram os trabalhos da comissão que deveria avaliar a norma. Com isso, a medida provisória perderá validade no próximo dia 16 de fevereiro. E a UNE vai reassumir o monopólio de emissão das carteirinhas de estudante.

VEJA TAMBÉM:

3. Mudanças no Código de Trânsito

Bolsonaro levou pessoalmente ao Congresso, em 2019, uma proposta para alteração no Código de Trânsito. Mas, na comissão especial da Câmara criada para analisar a proposta, o projeto recebeu um substitutivo com mais de 100 alterações ao que havia sido proposto pelo governo. Os deputados alteraram a ideia de Bolsonaro para subir de 20 para 40 pontos na CNH o limite para a suspensão do direito de dirigir. Eles também decidiram manter a punição para o motoristas que não utilizar a cadeirinha no transporte de crianças (o presidente queria acabar com a punição). A Câmara também tirou do projeto do governo a proposta de acabar com a exigência do exame toxicológico para motoristas profissionais. Bolsonaro chegou a reclamar das alterações.

Principais Manchetes

Receba nossas notícias NO CELULAR

WhatsappTelegram

WHATSAPP: As regras de privacidade dos grupos são definidas pelo WhatsApp. Ao entrar, seu número pode ser visto por outros integrantes do grupo.