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Presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) é o principal fator de reestruturação do ministério do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a partir de agosto.| Foto: Joédson Alves/EFE

Enquanto perdura a disputa entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), para definir quem terá a palavra final no esperado acordo de governabilidade entre o Planalto e o Centrão, essencial para garantir o êxito do atual mandato do petista, os prazos para a definição se esgotam e as pressões atingem níveis alarmantes.

O governo precisa garantir recursos para conter o avanço do rombo de suas contas e ainda mergulha na total incerteza em relação ao orçamento federal de 2024. Caso o projeto de novo marco fiscal, suspenso pela queda de braço entre Legislativo e Executivo, não seja votado até o dia 31, programas já previstos, como a nova edição do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), voltado a obras de infraestrutura, correm riscos. O arcabouço é requisito essencial para elaborar o Orçamento da União para o próximo ano.

Em meio às agendas no país e exterior, Lula retarda a decisão sobre quais ministérios acomodarão os nomes já escalados pelo Centrão: os deputados André Fufuca (PP-MA) e Sílvio Costa Filho (Republicanos-PE). Enquanto estica a corda, o presidente inviabiliza de vez a chance de a sua equipe econômica cumprir a promessa de zerar o déficit no próximo ano. Lula avisou que celebrará o acordo, porém enfatiza que mantém o controle de nomeações e cargos, reafirmando sua posição central.

Contudo, segundo analistas consultados pela Gazeta do Povo, caso insista em testar a paciência dos deputados, ele pode sofrer consequências mais severas, incluindo a necessidade de ceder ainda mais espaço no governo e de liberar recursos de maneira mais rápida, a exemplo da votação da reforma tributária - que exigiu do governo liberação recorde de emendas parlamentares diante da falta de uma base governista ampla na Câmara. Por outro lado, Lula receia atender demandas de imediato e transmitir a ideia de que se sujeitou ao domínio de Lira.

Demora em fechar acordo pode levar governo a pagar mais caro

João Henrique Hummel Vieira, diretor da Action Relações Governamentais, ressalta que, embora o Congresso tenha retomado atividades em agosto, o mês transcorre sem dar segurança quanto à solução de pendências.

“O momento crucial de decisão se mostra grave para um governo que, apesar de ter finalmente iniciado, ainda não tem todas as definições necessárias para alinhar seu futuro de maneira consistente com seus planos”, observou.

As dúvidas em torno do cenário fiscal se evidenciam e tendem a crescer enquanto inexiste sequer reunião entre líderes partidários da Câmara para deliberar sobre prazos e procedimentos relativos às mudanças do Senado no arcabouço.

“Tudo isso indica que a votação dessa questão só ocorrerá quando o governo conceder as contrapartidas esperadas, fortalecendo a colaboração com o Congresso por meio de cargos em ministérios, estatais e bancos. À medida que o impasse se prolonga, o preço das concessões a serem dadas pelo governo tende a crescer”, sublinhou Vieira.

Para complicar ainda mais a situação, o relatório prévio da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), apresentado pelo deputado Danilo Forte (União Brasil-CE), não contempla as regras do arcabouço. Isso sugere que as ambições do governo deverão esbarrar em restrições orçamentárias. Por esse motivo, as próximas semanas serão tomadas por ansiedade em meio a viagens de Lula.

Nos bastidores, um sinal das tensões é evidenciado pela estimativa do próprio Ministério da Fazenda, que prevê déficit de R$ 136,2 bilhões ao fim de 2023, equivalente a 1,3% do Produto Interno Bruto (PIB). Isso representa aumento de um terço em relação ao déficit de R$ 107,6 bilhões (1% do PIB) projetado em março. O aumento já resultou na necessidade de cortes de verbas não obrigatórias em programas sociais e projetos públicos, incluindo áreas como a educação básica, devido à continuidade das regras do teto de gastos.

Alívios no arcabouço ainda precisam de ser negociados

O Orçamento de 2023 previa um déficit fiscal de R$ 228,1 bilhões, que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, prometeu reduzir para R$ 100 bilhões por meio de medidas de aumento de receita e eventuais cortes de gastos. Sob pressão, Haddad tem de negociar com Claudio Cajado (PP-BA), relator do arcabouço na Câmara. Um ponto a ser discutido com o deputado é a emenda proposta pelo senador Randolfe Rodrigues (sem partido-AP), que cria margem orçamentária de R$ 30 bilhões a R$ 40 bilhões, sugerida pela ministra do Planejamento, Simone Tebet (MDB).

Cajado expressou nesta quinta-feira (10) a expectativa de concluir a apreciação das medidas até o fim da próxima semana. Para isso, ele conta com a reunião dos líderes dos partidos agendada para a noite de segunda-feira (14), na residência oficial da Câmara, pelo seu presidente, Arthur Lira (PP-AL). Durante entrevista à Novabrasil FM, Cajado reconheceu que o governo Lula tem enfrentado dificuldades devido às indefinições em torno de cargos para o Centrão, o que ocasionou o atraso na votação.

Mesmo dizendo que a agenda econômica da Câmara não se contamina por questões desse tipo, o deputado afirmou que o governo vem cometendo "grave equívoco" ao anunciar nomes de André Fufuca e Silvio Costa Filho como futuros ministros sem ter definido os respectivos ministérios. Ele considera que isso gera “clima desfavorável” para o encaminhamento da votação do arcabouço. O deputado informou ainda que, durante esta fase da tramitação da proposta de volta à Câmara, nem o ministro da Fazenda nem qualquer outro membro da equipe econômica entrou em contato com ele.

O relator avalia ainda outros pontos incluídos no Senado, como a exclusão da nova regra fiscal do Fundo Constitucional do Distrito Federal, do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) e os investimentos em ciência e tecnologia.

O presidente da Câmara, Arthur Lira, anunciou o adiamento da votação, revelando que há acordo só em relação à exclusão das verbas do Distrito Federal dos limites da regra. Os deputados resistem a tirar o Fundeb e os gastos em ciência e tecnologia, buscando pressionar Lula a concretizar a entrada do Centrão no governo.

No Senado, uma disputa adicional está em andamento devido às exceções aprovadas pela Câmara na reforma tributária. Segundo a equipe econômica, as adições aprovadas na Câmara poderiam aumentar as alíquotas do novo Imposto sobre Valor Agregado (IVA) em até 27%. O IVA visa unificar impostos nas esferas federal e estadual. De acordo com o texto aprovado pela Câmara, a alíquota máxima seria de 25,45%.

Eduardo Braga (MDB-AM), relator do projeto no Senado, está em negociações com Bernard Appy, secretário extraordinário para a reforma tributária do Ministério da Fazenda, buscando ponto intermediário. Os senadores receberão estudo sobre os custos das exceções propostas.

A reforma contempla cobrança reduzida, de 40% da “alíquota padrão”; isenção de alíquota para a cesta básica; e regimes especiais para setores financeiro, imobiliário e de combustíveis. Outra questão não resolvida diz respeito ao futuro conselho que substituirá o Conselho de Secretários Estaduais de Fazenda (Confaz) na determinação das alíquotas. Os sete estados das regiões Sul e Sudeste estão buscando melhorar a representação em relação aos demais, sobretudo os do Norte e Nordeste, o que já gera tensões no pacto federativo.

Câmara poderá impor novos obstáculos à agenda do Planalto

Na busca por influenciar a narrativa das negociações, Lula explicitou que não discutirá a alocação de vagas ministeriais com o Centrão, mas sim com os presidentes dos partidos.

Em mensagem indireta, Lira lembrou que sem o bloco informal, o Brasil poderia ter seguido o caminho da Argentina, sugerindo que a influência de pautas populistas prejudiciais à economia poderia ter sido mais acentuada sem o arranjo partidário. Antes, chegou a dizer que a permanência do ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, no cargo tinha “prazo de validade”.

Numa comunicação mais recente, o presidente da Câmara também trouxe a informação de que a pauta relativa à reforma administrativa, contrária aos planos do governo, poderá avançar por força das circunstâncias. O fato levaria o governo a lidar com uma explícita perda de poder.

Leandro Gabiati, da Dominium Consultoria, observa que Lula procura dilatar os prazos das necessárias negociações com partidos de centro e centro-direita, tentando assim controlar o tempo do processo de mudanças. “O presidente reconhece a importância de fazer concessões, mas almeja fixar limites para manter o espaço de poder que julga essencial para a realizar seus planos”, disse.

No entanto, essa postura enfrenta resistência evidente a partir das mensagens transmitidas por Lira e seus aliados desde a semana passada, indicando que poderão manter a pauta de votações bloqueada.

“Esse cenário está se tornando cada vez mais arriscado, pois poderá ter implicações até mesmo sobre a reforma tributária – projeto de importância significativa para as perspectivas econômicas –, que necessitará de ajustes no Senado antes de voltar à Câmara”, avaliou.

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