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O debate necessário sobre o trabalho infantil
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O presidente Bolsonaro causou nova polêmica ao falar que nossas leis trabalhistas são rígidas demais para crianças, alegando que os menores podem até fumar um "paralelepípedo de craque", menos trabalhar. A esquerda sensacionalista já saiu em campo para explorar o tema.

Não é de hoje, porém, que Bolsonaro reclama da dificuldade de crianças trabalharem, se os pais assim desejarem. Tampouco é de hoje a minha concordância com ele. Em julho do ano passado, por exemplo, escrevi esse texto após fala similar do presidente, em que dizia:

Em primeiro lugar, é bom lembrar que o trabalho é um dos mais poderosos caminhos para edificar o ser humano. Aprende-se trabalhando lições importantes para a vida. Mas claro que quando se fala nesse assunto vem à cabeça a imagem de pobres crianças trabalhando numa carvoaria. Os extremos são mesmo terríveis, mas o abuso não deve tolher o uso. Dependendo de qual trabalho a criança executa, ele pode sim ser útil até para a formação de seu caráter. O Barão de Mauá começou a trabalhar aos nove anos!

A jornalista Leda Nagle contou sua experiência pessoal nessa linha, como tantos outros formadores de opinião: “Eu comecei a trabalhar aos 10 anos no Armazém Mineiro , nosso armazém meu, do meu pai da minha mãe. Nós três trabalhamos juntos sempre. Eu ia pro Instituto Santos Anjos onde fui uma das suas melhores alunas e uma coisa nunca atrapalhou a outra”.

Ao ser criticada por alguns, deixou claro que não estava defendendo trabalho em minas de carvão ou prostituição infantil, e acrescentou: “Claro que sou contra exploração de qualquer ser humano, adulto ou criança. Mas eu acho que o trabalho em familia, mantendo o tempo de estudar e o temp de brincar pode sim ser somado ao tempo de trabalhar se preciso for. No meu caso foi assim e foi uma experiência feliz”.

O debate é necessário, de preferência deixando os preconceitos ideológicos e o romantismo de lado. O que todos querem, devemos partir dessa premissa, é o melhor para as crianças. A questão que surge, portanto, é como se obter isso. Não basta repetir que o ideal é a criança nunca trabalhar, pois devemos levar em conta a realidade como ela é, não como gostaríamos que fosse. Condenar qualquer trabalho infantil do conforto da classe alta é fácil; difícil é encontrar alternativas concretas para os filhos dos pobres.

A lei mais básica do ser humano é o instinto de sobrevivência. O governo pode escrever o que quiser em pedaços de papel, mas não pode alterar essa realidade natural, assim como não pode ignorar a lei gravitacional. A proibição legal do trabalho infantil pode ser moralmente desejável, porém não será ela que irá de fato eliminar tal problema social.

Países desenvolvidos, que se aproximaram mais dessa receita capitalista, não enfrentam hoje esses graves problemas de mão de obra semi-escrava ou infantil. No outro extremo, nações miseráveis que foram vítimas de governos interventores e totalitários apresentam elevadas taxas de trabalho infantil. Não adianta criar leis vetando isso, nem pregar códigos de ética bonitos no papel. As forças naturais serão mais fortes, e o uso da mão de obra infantil irá ocorrer de qualquer maneira, mesmo que na ilegalidade. Basta observar em Cuba a quantidade de meninas que se tornam prostitutas, algumas vezes em troca de nada mais que um prato de comida.

Por fim, Bolsonaro disse que se tivesse defendido a sexualização infantil seria aplaudido pelos progressistas, e está certo. Se for para meninos trabalharem de “drag queen” em night clubs todos os progressistas achariam lindo e moderninho. Os valores morais da esquerda estão totalmente invertidos. Talvez seja falta de trabalho…

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Na verdade, esse tema não é nenhuma novidade para mim. Nesse outro texto, de 2015, tratei da mesma questão, reconhecendo que o trabalho infantil, em geral, não é desejável, mas tampouco deve ser tratado como uma "aberração", já que pode se tratar de uma necessidade muitas vezes:

Considero repugnante constatar a existência de trabalho infantil em pleno século XXI. Crianças deveriam ser livres para brincar, estudar, criar, enfim, viverem como crianças, sem as responsabilidades dos adultos. A vida já é dura demais, deixem-nas curtirem a fantasia que é ser uma criança mais inocente. O combate ao trabalho infantil deve ser sério, e ficar a cargo de quem realmente pode alterar esse quadro. Infelizmente, não é o que ocorre. Delegam ao estado o controle disso, e a bem-intencionada atitude resulta em um agravamento da situação. Vamos entender a razão disso.

A lei mais básica do ser humano é o instinto de sobrevivência. O governo pode escrever o que quiser em pedaços de papel, mas não pode alterar essa realidade natural, assim como não pode ignorar a lei gravitacional. A proibição legal do trabalho infantil pode ser moralmente desejável, porém não será ela que irá de fato eliminar tal problema social. O próprio ensinamento moral, muitas vezes via a religião, tem seu papel relevante, mas não suficiente. No desespero da fome, tudo isso cai para segundo plano, e aquele instinto de sobrevivância fala mais alto.

Quando o estado cresce demais, buscando solucionar todas as mazelas da humanidade, ele absorve como um buraco negro os recursos disponíveis. Governo não cria renda, apenas consome e distribui. Justificando seus impostos asfixiantes através da luta pela justiça social, o governo acaba desestimulando o acúmulo de capital, fundamental para investimentos que trarão maior produtividade do trabalho, que por sua vez possibilitaria maior renda disponível. Economia não é um jogo de soma zero, onde para um ganhar o outro precisa perder. Um país sem os grandes entraves burocráticos típicos do estado inchado e sem o peso dos impostos confiscatórios pode acumular muito mais capital, e apresentar ganhos de produtividade expressivos, onde menos trabalho irá gerar mais resultado. Esse é o caminho econômico para se combater a fome e, por tabela, o trabalho infantil.

Países desenvolvidos, que se aproximaram mais dessa receita capitalista, não enfrentam hoje esses graves problemas de mão de obra semi-escrava ou infantil. No outro extremo, nações miseráveis que foram vítimas de governos interventores e totalitários apresentam elevadas taxas de trabalho infantil. Não adianta criar leis vetando isso, nem pregar códigos de ética bonitos no papel. As forças naturais serão mais fortes, e o uso da mão de obra infantil irá ocorrer de qualquer maneira, mesmo que na ilegalidade. Basta observar em Cuba a quantidade de meninas que se tornam prostitutas, algumas vezes em troca de nada mais que um prato de comida. Se não houver riqueza disponível, possível apenas através do acúmulo de capital viável num ambiente de livre mercado e pouco governo, o trabalho infantil poderá assumir um caráter ainda mais nefasto. A experiência das nações socialistas comprova isso.

Normalmente, os ferrenhos combatentes do trabalho infantil encontram-se nas nações ricas ou nas elites locais. São pessoas bem-intencionadas, que ficam chocadas com a realidade dessa gente. Esquecem que enquanto o homem lutava para sobreviver na natureza, crianças ajudavam, participavam. Quando não existia excesso de alimentos e outros benefícios possíveis através do progresso capitalista, crianças executavam naturalmente parte das tarefas necessárias para a sobrevivência. Foi o acúmulo de riqueza, concentrada por mérito próprio nas nações desenvolvidas, que permitiu esse “luxo” de aliviar as crianças desse pesado fardo. E atualmente, as minorias que desfrutam desse avanço ficam revoltadas com a situação dos demais. É natural.

O perigo surge quando essas pessoas, imbuídas de nobres intenções, apresentam suas “soluções” românticas para o problema. Na verdade, a maioria nem mesmo se preocupa em apresentar alguma solução, mas em apenas condenar o fato, a realidade. Os que arriscam algum palpite, pedem maior intervenção estatal. O tiro sai, obviamente, pela culatra. E as nações pobres ficam ainda mais miseráveis, enquanto o trabalho infantil passa a ser ainda mais necessário para que cada família consiga seu sustento. Os desejos utópicos sempre se preocuparam somente com o fim, nunca com os meios. Infelizmente, a adoção dos meios errados irá nos levar para ainda mais longe do fim desejável.

Repito: ninguém pode ficar satisfeito com o trabalho infantil em pleno século XXI. Mas devemos debater de forma séria e madura os melhores métodos para erradicá-lo, sem romantismo ou hipocrisia. Claro que ninguém vai defender ou justificar um garoto de 7 anos em condições desumanas numa carvoaria, por exemplo. Não é disso que se trata. E sim de compreender que há casos em que algum trabalho decente, honesto, pode representar a melhor alternativa disponível. Fugir desse debate é virar as costas para essas crianças. No afã de ajudá-las, mas sem as ferramentas certas, o resultado pode ser ainda pior.

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Como se não bastasse, e para provar que esse assunto já me preocupa faz tempo, segue outro texto publicado no Instituto Liberal, de 2008:

“Pais pobres, assim como pais ricos, em geral desejam o melhor para seus filhos; a pobreza é o que leva muitos deles, quando forçados a optar, a mandar os filhos para o trabalho e não para a escola.” __ Jagdish Bhagwati

A existência de milhões de crianças tendo que trabalhar para sobreviver, em pleno século XXI, é algo chocante para muitos, com razão. Crianças deveriam ter tempo livre para brincar e investir na sua formação. No entanto, esse é um tema que desperta muito calor, mas pouca luz. Por falta de conhecimento adequado, a maioria foca nos remédios errados, chegando até a atacar os certos. A globalização, por exemplo, é vista por muitos como um incentivo ao trabalho infantil, com a imagem de multinacionais contratando crianças para suas fábricas. Como de praxe, comparam uma realidade muitas vezes dura com um sonho utópico, e apresentam soluções que, no fundo, agravam a situação.

Em primeiro lugar, é importante fazer alguns comentários. Nem todo trabalho infantil deve ser condenado. Creio que ninguém defende a proibição da profissão de ator-mirim, por exemplo. Caso contrário, o astro de Esqueceram de Mim, Macaulay Culkin, não teria tido a chance de ficar rico, como tantos outros atores. Mas não é apenas isso. Mesmo profissões vistas como menos interessantes podem contribuir para a formação das crianças, algumas vezes bem mais do que a doutrinação ideológica de professores marxistas – infelizmente algo muito comum no Brasil. Não vamos esquecer que o Barão de Mauá, o homem mais rico que o País já teve em termos relativos, começou a trabalhar no comércio aos 9 anos de idade. Não resta dúvida de que isso fez mais por seu futuro do que aprender biologia. O revolucionário americano Thomas Paine é outro exemplo, tendo começado a trabalhar aos 13 anos de idade. Como estes, existem vários outros exemplos. Vários jogadores de futebol famosos focavam apenas no esporte desde cedo, como melhor alternativa para um futuro melhor. Sorte deles.

Mas creio que, de forma geral, o trabalho infantil é visto como algo indesejado, principalmente quando dificulta muito a educação das crianças. Mesmo assim, é importante deixar claro que o trabalho infantil não é algo novo, que vem se agravando. Pelo contrário: é uma realidade que acompanha a humanidade desde sempre, e que vem, somente num período mais recente, se reduzindo. Compreender as causas disso, portanto, é fundamental para atacar o problema, e deveria ser o foco de todos aqueles que realmente desejam pôr um fim na necessidade de se trabalhar enquanto criança. Infelizmente, muitos críticos do trabalho infantil preferem concentrar sua energia no que parece ser o “monopólio da virtude”, assumindo que a finalidade nobre – o término do trabalho infantil – pertence somente a eles. Os demais são vistos como insensíveis, que não ligam para as crianças, colocando o lucro acima da qualidade de vida delas.

Essas pessoas fogem do debate honesto sobre os melhores meios para resolver o problema. Preferem uma visão romântica, alegando que os capitalistas, defensores da Revolução Industrial, desejam o trabalho infantil, ignorando, assim, que foi justamente o capitalismo que possibilitou a redução drástica do problema. Aqueles que usam a situação precária – aos nossos olhos atuais – da época da Revolução Industrial, para associar capitalismo ao trabalho infantil, esquecem que antes dela a coisa era muito pior. Ou mesmo durante aquela época, basta comparar a situação na Inglaterra com o caos na Polônia, por exemplo. A premissa dessas pessoas parece ser a de que os pais não davam a mínima para seus próprios filhos. No fundo, é claro que colocar os filhos para trabalhar era uma necessidade, pois a alternativa era morrer de fome. A Revolução Industrial, ao contrário de inimiga das crianças, foi seu grande aliado. Até 1400, cerca de metade das crianças morria antes de completar 5 anos. O progresso capitalista, que seguiu seu curso, ainda é o melhor amigo das crianças, permitindo cada vez mais uma vida confortável e mais longa, sem a necessidade de trabalho numa idade mais jovem e sem tanto risco de morte prematura.

O professor da University of Columbia, Jagdish Bhagwati, escreve no livro Em Defesa da Globalização: “A verdade é que a globalização – onde quer que se traduza em maior prosperidade coletiva e em redução da pobreza – tão-somente acelera a redução do trabalho infantil e estimula a matrícula no ensino elementar, gerando instrução, e, como defendo a partir da minha análise do milagre do Leste Asiático, a instrução, por sua vez, permite o crescimento rápido. Temos aqui, assim, um círculo virtuoso”. Devemos assumir, naturalmente, que os pais são, em geral, os mais interessados no futuro dos seus filhos. Parece ingenuidade demais achar que os burocratas do governo serão mais dedicados nessa tarefa que os próprios pais. Logo, é evidente que os pais vão investir na educação dos filhos sempre que isso for possível e interessante. Se o valor presente da educação é baixo, porque não existem muitas oportunidades de emprego e o mais rentável é investir nos contatos com o governo, então a educação ficará em segundo plano. O problema é quando a educação não compensa muito. Como disse William Easterly, do Banco Mundial, em O Espetáculo do Crescimento, “criar pessoas com elevada qualificação em países onde a atividade mais rentável é pressionar o governo por favores não é uma fórmula de sucesso”.

Assim, como coloca Bhagwati, “a simples proibição do uso de mão-de-obra infantil dificilmente erradicará o trabalho infantil, fazendo apenas com que os pais pobres mandem clandestinamente seus filhos trabalharem e os façam assumir ‘ocupações’ como a prostituição”. Quem ainda duvida disso, basta ver o que ocorre em Cuba. O “paraíso socialista”, mesmo com a ditadura repressora, é uma fábrica de prostituição infantil. Já os países mais capitalistas e liberais, com toda a ganância na busca pelo lucro, praticamente erradicou o trabalho infantil pesado.

O economista-chefe do Financial Times, Martin Wolf, foi na mesma linha de Bhagwati em Why Globalization Works, lembrando que a proporção de crianças de 10 a 14 anos na força de trabalho caiu, segundo o Banco Mundial, de 23% nos países em desenvolvimento em 1980 para 12% em 2000. A queda nos países que abraçaram mais a globalização e fizeram reformas liberais foi mais expressiva. No Leste Asiático a queda foi de 26% para 8%. Na China, foi de 30% para 8%. Já na África Subsaariana a redução foi apenas de 35% para 29%. Como fica claro, o verdadeiro remédio para o mal do trabalho infantil é a globalização, o capitalismo, as reformas liberais. Wolf afirma: “Os pais não colocam seus filhos para trabalhar por maldade ou indiferença, mas somente por necessidade”. Logo, o crescimento econômico é o caminho para o combate ao trabalho infantil.

A redução de crianças trabalhando pesado não se deu por conta de fiscalização de governos, leis duras ou esmolas estatais, mas sim por causa do avanço econômico, fruto do capitalismo global. Aqueles que realmente ficam indignados com a imagem de uma criança trabalhando numa lavoura ou carvoaria deveriam largar a retórica de lado e procurar entender o que de fato pode combater esse mal. Se fizerem isso com honestidade, irão abandonar o discurso antiglobalização, vão parar de condenar a ganância das empresas pelo lucro, e entenderão que o capitalismo liberal é justamente o único meio para atacar o problema. O resto é papo de quem gosta de posar de nobre, mas não liga muito para resultados concretos.

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