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“O Marajó pede socorro e não é de hoje”, diz a senadora Damares Alves (Republicanos-DF).
“O Marajó pede socorro e não é de hoje”, diz a senadora Damares Alves (Republicanos-DF).| Foto: Geraldo Magela/Agência Senado

Denúncias de exploração sexual de crianças e tráfico de pessoas menores de idade na Ilha de Marajó, no Pará voltaram à tona em fevereiro após a repercussão de uma música da cantora Aymeê com o título "Evangelho de Fariseus".

Na letra, a cantora cita os problemas sociais e ambientais na ilha amazônica: "Enquanto isso, no Marajó/ O João desapareceu / Esperando os ceifeiros da grande seara / A Amazônia queima / Uma criança morre / Os animais se vão / Superaquecidos pelo ego dos irmãos".

A canção repercutiu nas redes sociais, após a cantora se apresentar na semifinal do programa "Dom Reality", competição musical entre artistas do universo gospel, com transmissão no YouTube. Depois da apresentação, Aymeé fez um breve relato das tragédias e crimes que ocorrem em Marajó.

"Marajó é uma ilha a alguns minutos de Belém, minha terra. E lá tem muito tráfico de órgãos. Lá é normal isso. Tem pedofilia em nível hard. As crianças de 5 anos, quando veem um barco vindo de fora com turistas (a jovem se interrompe)... Marajó é muito turístico, e as famílias lá são muito carentes. As criancinhas de 6 e 7 anos saem numa canoa e se prostituem no barco por R$ 5", afirmou Aymeé.

O anúncio feito pela cantora reacendeu o debate sobre os casos de prostituição e pedofilia que são investigados oficialmente desde 2006 e foram alvo de denúncia na gestão da ex-ministra dos Direitos Humanos, senadora Damares Alves (Republicanos-DF). Com a retomada do assunto, artistas e influenciadores lançaram a campanha #justicaporMarajo pelas redes sociais cobrando alguma solução para os crimes. Porém, na época que Damares denunciou os casos ela foi chamada de "louca" e criticada por artistas.

Em setembro de 2023, o Ministério Público Federal (MPF) ajuizou uma ação civil pública contra Damares e a União, pedindo o pagamento de indenização de R$ 5 milhões à população do Arquipelágo do Marajó, no Pará, por suposta "desinformação" em acusações de "práticas sexuais violentas e torturas com crianças". A assessoria da parlamentar disse que "ela nunca foi citada" e, na época, reforçou que, por outro lado, a senadora aguardava que o MPF fosse "implacável na caça aos abusadores e exploradores sexuais de crianças e adolescentes".

A ação é referente a um vídeo, que circulou na internet em outubro de 2023, em que a ex-ministra falou sobre denúncias de crimes contra crianças do Marajó, como tráfico para o exterior, mutilações corporais e abusos sexuais. O MPF alegou que Damares não apresentou provas dos supostos crimes citados. Segundo a pasta, foram registradas, entre os anos de 2016 e 2022, 5.440 denúncias pelo Disque 100 (canal de denúncias do ministério) de exploração sexual de menores no estado do Pará.

Em 2022, a Gazeta do Povo mostrou que os casos de exploração sexual e pedofilia são investigados há décadas na região e foram alvo de inquérito iniciado a pedido da Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM) da Câmara dos Deputados, em 2006.

Com o objetivo de investigar e apurar a prática de crimes de pedofilia, também foi criada, em 2008, no Senado, a CPI da Pedofilia, cujo os trabalhos foram encerrados em 2010. Em suas recomendações aos estados, o relatório de quase 1.700 páginas sugere medidas de contenção da pedofilia no Pará. Uma delas solicitou ao Tribunal de Justiça do estado a criação de comissão interna especial para apreciar com prioridade os processos de exploração sexual de crianças e adolescentes.

De acordo com o relator da CPI, o ex-senador Demóstenes Torres (DEM/GO), o estado do Pará havia apresentado casos "ostensivos" de pedofilia, com o envolvimento de autoridades.

Damares volta a falar sobre as denúncias

Após o assunto vir à tona por meio da música de Aymeé, a senadora Damares Alves parabenizou a cantora e disse que se sentiu "muito tocada" com a mensagem. "Ela é de Belém, ali da região. Ela sabe do que está falando", escreveu a parlamentar na rede X.

Damares relembrou que o seu primeiro contato com a situação no Marajó foi no inicio dos anos 2000, na Comissão de Direitos Humanos da Câmara. E que, depois de acompanhar a CPI sobre o Tráfico de Pessoas, conheceu Dom Azcona, um ativista responsável por denúncias de crimes contra crianças na região.

A senadora também relembrou a CPI de Abuso e Exploração de Crianças e Adolescentes de 2014 que revelou "novas denúncias de abuso e exploração sexual de crianças na região". "Após isso, inúmeras reportagens denunciaram o que acontecia ali: as crianças que subiam nos barcos para serem abusadas em troca de óleo diesel, em troca de comida ou de míseros trocados. Elas se arriscavam nesse processo e tudo isso acontecia à luz do dia. Por que ninguém fazia nada a respeito?", escreveu Damares.

"Quando virei ministra de Direitos Humanos coloquei como missão acabar com aquilo tudo. E estive lá dezenas de vezes para ouvir o povo e entender o que acontecia ali. Todo mundo culpava a pobreza e a distância das instituições de Estado. E nossa resposta foi criar um programa, o Abrace o Marajó, para unir governos e a sociedade civil para a melhoria do IDH da região", complementou.

Segundo a senadora, durante a sua gestão foram realizadas "ações pontuais para socorro da população, com o envio de cestas básicas". "Tínhamos grandes planos e tornamos nossa ação em um programa instituído por decreto. Mas aí veio a pandemia, e praticamente todos os recursos que havíamos previsto para a região foram transferidos para o combate à doença e suas consequências. Ficou essa sensação de missão não cumprida", disse.

Damares afirma que os casos aumentaram após o governo Lula e o Ministério dos Direitos Humanos cancelarem o programa Marajó. De acordo com o Ministério de Lula, o antigo programa de Damares foi suspenso pela baixa participação social no projeto e pouca efetividade das ações.

"O que o Ministério fez de concreto desde então? Ainda hoje ouço e leio relatos de abusos na região. Isso me parte o coração e espero, sinceramente, que esta música acorde nossa sociedade, acorde o Brasil. Para que quem denuncia os abusos na região não seja silenciado. Para que as instituições dediquem menos tempo com a polarização política e na perseguição a supostos adversários, e estejam mais engajadas em apresentar respostas concretas a este problema", reforçou a senadora.

"O Marajó pede socorro, e não é de hoje. Que desta vez as pessoas sejam verdadeiramente compelidas a agir ao ouvir o choro silencioso das crianças", concluiu Damares.

Pedido de CPI é protocolado na Câmara dos Deputados

Os deputados Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e Paulo Bilynskyj (PL-SP) protocolaram, no início de março, um pedido de abertura de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar casos de exploração sexual infantil na Ilha do Marajó, no Pará.

Os deputados do PL conseguiram as 171 assinaturas necessárias para o requerimento apesar da resistência de parlamentares de partidos de esquerda, como PT e PSOL.

A instalação da CPI precisa ser autorizada pelo presidente da Casa, o deputado Arthur Lira (PP-AL).

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