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Ludmila Lins Grilo se defende no CNJ mostrando que não tem processos pendentes
Ludmila Lins Grilo se defende no CNJ mostrando que não tem processos pendentes| Foto: Reprodução/YouTube/CNJ

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) instaurou dois processos disciplinares contra a juíza Ludmila Lins Grilo e determinou seu afastamento do cargo de titular da Vara de Infância e Juventude de Unaí (MG). Um dos procedimentos foi aberto em razão de críticas ao inquérito das fake news, conduzido por Alexandre de Moraes no Supremo Tribunal Federal (STF), e outro por suposto desleixo na gestão dos processos sob sua responsabilidade. Ambos os processos abertos podem, ao final, resultar em aposentadoria compulsória.

As decisões foram unânimes entre os 15 integrantes do órgão, que seguiram o voto do corregedor-nacional de Justiça, Luís Felipe Salomão, que é ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Assim como ele, quase todos reprovaram declarações e condutas da juíza, até mesmo falas de sua defesa durante sustentação oral na sessão de julgamento.

“A reclamada não cumpre seus deveres básicos, deixando de comparecer no fórum mesmo sem tendo autorização para exercer teletrabalho, negligenciando a gestão do cartório e deixando de fiscalizar os atos de seus subordinados. Ao invés de priorizar a execução desses deveres de gestão, a magistrada participa de inúmeras atividades na internet, com participações em redes sociais, entrevistas, lives, aulas onde se obtém remuneração”, disse Salomão ao votar pela abertura do primeiro processo.

Ele apontou “total desleixo” com a vara, com réus presos sem sentença e soltos sem audiência. Disse que ela não comparecia presencialmente à vara, passou a morar fora da comarca de Unaí e assinava decisões, preparadas por sua assessoria jurídica, sem ler os processos.

No outro processo, relativo a entrevistas e postagens em redes sociais com críticas ao inquérito das fake news, principalmente, Salomão apontou violação a deveres da magistratura. “Esses fatos são seríssimos, graves, incompatíveis com a função da magistratura, porque ferem diretamente dispositivos do Código de Conduta, da legislação federal e causam um abalo para a imagem de todo o Poder Judiciário”, afirmou o ministro.

Durante sua defesa, Ludmila disse que ingressou na vara em 2020, no início da pandemia de Covid, e seguiu determinação do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG) de suspender audiências presenciais, embora tenha discordado. Depois, alegou que precisou atuar à distância por receber ameaças de morte. Apresentou documento do gabinete de segurança institucional do TJ-MG recomendando “redução no nível de exposição” e “ações que evidenciem a localização imediata e posterior da vítima”.

“Ninguém poderia saber onde moro nem onde eu trabalho. Consequentemente, ninguém pode saber onde estou, ninguém pode saber que estou no fórum e de lá não posso trabalhar. Então, eu mesmo tive de prover minha própria segurança, trabalhando integralmente por videoconferência”, disse a juíza durante a sustentação. Acrescentou que o TJ-MG e o CNJ, sabendo de sua situação, nada fizeram por sua proteção e passaram a promover seu  “assassinato de reputação”.

“Tanto no CNJ quanto o TJ-MG demonstraram absoluto desprezo e no mínimo indiferença à minha integridade física e à minha vida. Lamentavelmente o Estado falhou e coube a mim mesma promover as medidas necessárias para a minha própria segurança”, disse.

Ao final, apresentou uma certidão do TJ-MG, juntada ao processo, atestando não haver em seu gabinete processos pendentes de despachos ou julgamentos. Comprovou ainda ter realizado 1.966 audiências desde 2020.

As alegações não convenceram os conselheiros. Vários deles, que são juízes e promotores, disseram que também recebiam ameaças e não deixavam de comparecer presencialmente nos locais de trabalho.

“Já fui ameaçada como juíza criminal, que sou há 30 anos. E acho que é incompatível quem está numa situação como essa, ter um excesso em redes sociais, por exemplo. Isso não é aceitável. E todos os magistrados que passam por esse tipo de situação continuam fazendo audiência dentro do fórum, indo despachar coordenando os trabalhos da secretaria. É uma função que deve ser coordenada pelo juiz, é o gestor máximo da unidade”, disse a desembargadora Salise Sanchotene.

Críticas ao inquérito das fake news

No segundo processo, Ludmila é acusada de violar deveres do magistrado, por supostamente adotar procedimento incompatível com a dignidade, a honra e o decoro de suas funções. Nele, Salomão apontou sete fatos.

O primeiro foi uma entrevista em dezembro de 2020 à rádio Jovem Pan em que disse que o inquérito das fake news causa “um problema grave de instabilidade institucional”. “É estarrecedor que um ministro da Corte possa ser a vítima, o investigador e o juiz”, disse, referindo-se a Alexandre de Moraes. Comparou a investigação aos inquéritos de Moscou, instaurados pelo regime de Joseph Stálin e que um dos expedientes contra isso seria aprovar, no Senado, o impeachment do ministro.

Em sua defesa, Ludmila disse que fez as críticas na condição de professora e coautora de um livro sobre o inquérito. “Não se pode impedir que uma professora e escritora fale publicamente sobre sua própria obra”, afirmou na sessão.

Ela também foi processada por compartilhar e elogiar, nas redes, um artigo do jornalista Paulo Briguet, que comparava Moraes, Luís Roberto Barroso e o próprio Salomão ao procurador-geral soviético Andrey Vyshinsky. “Um artigo brilhante que fala sobre os processos de Moscou, em que o procurador soviético, atua como acusador, juiz e vítima. Tudo que nós falamos no inquérito do fim do mundo. Tem tudo a ver com minha atividade como professora. Nada mais justo que compartilhar esse brilhante artigo, com o qual corroboro cada palavra e cada vírgula”, disse Ludmila na sessão.

Outro fato apontado foi um tuíte em que ela havia divulgado um novo canal de Allan dos Santos, após o STF determinar o bloqueio de seus perfis nas redes sociais.

“É meu amigo pessoal, sou amiga dele, da esposa dele, conheço a família, os filhos. É um grande conhecedor de filosofia, especialmente da filosofia tomista, e um grande conhecedor de ciência política. Depois de perder suas redes sociais e site, sem expor nenhum tipo de comentário, sem positivo nem depreciativo, eu apenas disse que ele criou uma plataforma própria para exercer seu ofício. Não fiz nenhum comentário, não mandei ninguém seguir, clicar, comprar nada dela. O STF não estabeleceu vedação perpétua ao senhor Allan dos Santos e esse site dele nunca foi objeto de decisão judicial”, afirmou a juíza.

Ela ainda é acusada de participar de atividade político-partidária por comparecer a um evento conservador, em setembro de 2021, em Florianópolis. Em sua defesa, afirmou que o evento tinha caráter cultural e não era bancado por qualquer partido, nem com dinheiro público. Outro fato apontado contra ela foi uma postagem na qual criticou regra da lei eleitoral que limita o tamanho da letra de propagandas de campanha. “O cagarregrismo cultural não dá trégua”, postou, ao comentar notícia sobre uma busca e apreensão, no ano passado, determinada contra o então candidato a senador Sergio Moro, em razão da propaganda.

Por fim, foi acusada por “aparentemente, menosprezar o cargo que ocupa”. Em setembro, em resposta a um seguidor que a indagou sobre uma possível demissão, respondeu: “Essa é a mentalidade média do brasileiro carguista: a maioria acha que perder um carguinho significa a destruição de alguém”.

Na sessão, ela disse que mantém o que escreveu. “Talvez seja costume entre magistrados, mas não há norma que me obrigue a idolatrar cargos. A única coisa a quem eu adoro é a Deus, ao nosso Senhor Jesus Cristo, a quem eu dedico a minha fala, mas todos os meus atos praticados, pela resgate da liberdade no Brasil”, afirmou.

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