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O que você faria se encontrasse uma coruja no seu quintal? Bateria o pé no chão e diria:

– Xô, bicho, xô?

Talvez fingisse que não viu e voltaria para dentro de casa, em silêncio.

Ou, quem sabe, sairia gritando:

– Socorro, um bicho!

Eu tentei cuidar da coruja que apareceu no quintal do vizinho na última quinta-feira. "Oh, mulher metida!" Você pode estar se dizendo. "O bicho nem estava no seu quintal! Por que se meter com ele?"

Pois não estava mesmo no meu quintal. A coruja apareceu em um pequeno bosque espremido entre alguns quintais da vizinhança. Bosque que deve ter dono, mas não está cercado. Portanto, podemos passear nele, como eu fiz na quinta-feira, com meus filhos. Passeio curto, mas logo demos de cara com aquela coisa esquisita, que demorei a reconhecer. Uma coruja cinza, pequena, cercada por moscas varejeiras (essas sim umas criaturas nojentas). A presença de moscas é mau sinal e a coruja realmente parecia mais pra lá do que pra cá.

Pois bem, depois de rápida conferência familiar, em que houve quem pedisse para deixarmos aquilo de lado, levei a coruja para casa.

E aí voltamos ao início desta conversa: o que é que se faz com uma coruja? O que ela come? Onde viveria uma coruja doméstica? Na gaiola? Harry Potter tem uma coruja mansa, a Edwiges. As corujas são mansas?

A Gracinha é mansa. Gracinha é o nome que dei para a ave. Arranjei uma caixa de papelão (parece que tem sempre um vizinho comprando televisão, por isso é só olhar em volta que se acha uma caixa grande) e instalei-a lá dentro, protegida de cães, gatos e crianças. Ela concordou em beber um pouco de água diretamente de uma colher.

Fui atrás de informações sobre o que fazer com um animal silvestre que cruza o seu caminho. Como previa, passei pelo empurra-empurra dos órgãos públicos. Prefeitura informa que você tem de telefonar para outro número, pelo qual a atendente te dá outros dois números. No primeiro, a ligação cai sem que alguém tenha respondido. O segundo número era do Ibama. Quem atendeu me disse para levar a coruja até eles e respondeu minhas perguntas sobre a alimentação da Gracinha: ela precisa de papinha de carne, mas ia ser difícil fazê-la comer. O que o Ibama faria com ela? Cuidaria dela em um abrigo e, se fosse o caso, reintroduziria no ambiente silvestre. O que era improvável, me explicou a moça, porque ela não saberia mais como viver no mato.

No fim do dia, descobri que Gracinha havia se recuperado muito bem lá dentro da caixa de televisão, mostrando que tem a força dos jovens e dos selvagens. Estava mais firme nas pernas, os olhos muito abertos e muito, muito mansa. Aceitou o cafuné e fechou os olhinhos redondos no que eu traduzi como expressão de prazer. Subiu no meu ombro como a amiga do Harry Potter faz com ele. Mas não comeu nem bebeu.

Por isso, ontem cedo, rumei para o Ibama com a coruja em uma caixa de sapato. Logo na recepção, preencheram um formulário com meus dados, que me deram para assinar. Tive um pouco de medo de ser enquadrada como suspeita de algum delito envolvendo a vida selvagem. Mas como a funcionária escreveu meu nome errado e, apesar de advertida de que aquele nome não era o meu, não se deu ao trabalho de corrigir, deduzi que não estavam me tratando como suspeita.

Insisti em pedir informações sobre o futuro da coruja – a equipe não estava interessada em me dar satisfações. Garantiram que ela será encaminhada para um lar digno.

Infelizmente, minha timidez me impediu de contar aos funcionários que a coruja já tem nome e que gosta de cafuné.

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