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Faz tempo que os jogadores de futebol brasileiros são chamados de macaco quando enfrentam adversários hispânicos. Chilenos, espanhóis, argentinos sempre usam essa estratégia rasteira para incomodar os brasileiros. Pura inveja diante do talento dos nossos homens em campo, dirão alguns. Uma inveja canalizada de forma muito estúpida, diremos todos nós.

Não foi por acaso que o lateral do Barcelona Daniel Alves reagiu quando um torcedor babaca do Villareal lançou a banana contra ele. Com cara de "não estou nem aí", ele pegou a banana no chão, descascou rapidamente e levou inteira à boca. Em seguida, bateu o escanteio. É de se admirar o sangue frio do rapaz. O que se seguiu foi bonito de se ver até certa altura. Depois ficou desconcertante.

Me explico. No primeiro tempo, houve o lance do Daniel Alves dentro de campo. Ele registrou a agressão, mas tirou a força simbólica que o torcedor do Villareal quis dar à fruta. A banana é uma fruta, a fruta é um alimento e ponto final. Eu sou um negro (ou mulato), o negro é um ser humano e ponto final.

No segundo tempo, houve a apropriação do lance do Daniel Alves por outros. Neymar postou nas mídias sociais uma foto sua com o filho em que segura uma banana com a legenda "#somostodosmacacos".

Aqui o debate tomou vários caminhos. Muitos cidadãos anônimos encamparam a ideia de protestar contra o racismo dizendo que somos todos macacos. Somos todos iguais e se um de nós é macaco, então todos somos. Há quem diga que é uma estratégia equivocada e pode-se ter um longo debate sobre isso. O que quero registrar aqui é que o apoio dos "comuns" ao Daniel Alves teve a força e a simpatia da espontaneidade.

Muitas celebridades também aderiram e aí a situação começou a degringolar. Celebridades dão visibilidade às causas, é verdade. Mas também fazem tudo parecer jogada de mar­keting. Celebridades sempre parecem oportunistas. Desculpem-me as celebridades de boa vontade, mas eu insisto: o glamour que as cerca torna tudo artificial, estratégico, comercial.

Em seguida, mais um lance. Soube-se que Neymar não bolou a tal campanha "somos todos macacos". Foi uma agência de publicidade que ele contratou para isso. Neymar estava incomodado com o racismo que ele e seus colegas brasileiros sofrem jogando na Europa e resolveu se expressar publicamente da forma que está acostumado a se expressar: ou seja, orientado por publicitários.

Dá para entender a motivação de Neymar e dá para entender que ele tenha visto no gesto do colega Daniel Alves um bom gatilho para sua campanha. Mas a falta de naturalidade que se vai desvelando em tudo isso causa desconforto. Infeliz mesmo foi o gesto de Luciano Huck, que colocou à venda uma camiseta com a tal mensagem "somos todos macacos" em sua loja virtual. Diante das reações negativas, se defendeu dizendo que o dinheiro arrecadado seria revertido para causas sociais e tirou a camiseta da loja. Está escrito no site de Huck, no pé da página, que "parte do lucro obtido com as vendas das camisas são revertidas (sic) para instituições que fazem o bem". Qual parte? Cinco por cento? Quais instituições? Tudo muito vago, mal comunicado.

Se a campanha da dupla Daniel Alves/Neymar terá algum efeito positivo, não sei avaliar. Mas sei dizer que o aspecto "somos todos celebridades" tem um dedo podre. Assim como tem um dedo podre, que estraga o que toca, essa profissionalização de cada gesto da celebridade.

É tocante ver a mobilização espontânea das pessoas por uma causa justa. Mas no nosso mundo que gira a mil por hora, você logo fica sabendo do lado planejado, comercial que está por trás da movimentação. Fomos todos manipulados? Somos todos bobos?

Em se tratando das estrelas do futebol, que não pisam no gramado por menos que uma fortuna, há permanentemente o risco de que tudo que fazem soe artificial, pedante, fútil. E olha que eles são ídolos! Mas são ídolos e ao mesmo tempo celebridades. E as celebridades... Ah, as celebridades. Estas são sempre irritantemente oportunistas. Lembre que o capital de uma celebridade é sua fama. É da fama que a celebridade tira sua grana. Onde há celebridade há dinheiro. Há business. Nem sempre há sinceridade. E não dá para fazer uma campanha contra o racismo sem sinceridade.

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