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Desde sua criação, em 2013, o Mais Médicos está no centro de um imbróglio entre Ministério da Saúde (MS) e associações de médicos. Diante da baixa adesão de profissionais brasileiros, o governo passou a aceitar formados em outros países – principalmente cubanos, graças a um acordo intermediado pela Organização Pan-Americana de Saúde (Opas) – sem obrigatoriedade de validação do diploma. Fez-se a polêmica: muitas entidades de classe romperam com o ministério e o programa virou alvo de críticas de quem via com ressalvas a presença de médicos cubanos no país.

Agora, com a nomeação do paranaense Ricardo Barros para a cadeira de ministro da Saúde, a situação pode mudar. O ministro já declarou que o MS quer um Mais Médicos de brasileiros e que serão criados incentivos para ampliar essa adesão, mas não detalhou quais serão esses mecanismos nem em quanto tempo os estrangeiros serão desvinculados.

Estrangeiros na corda bamba

Com 70% dos médicos vinculados ao programa vindo do exterior – a maior parte de Cuba graças a um acordo de cooperação entre os países –, hoje, o Mais Médicos depende dos profissionais estrangeiros para funcionar. Pelo menos é isso que defendem a Frente Nacional de Prefeitos, a Associação Brasileira de Municípios e o Conselho Nacional de Saúde, entidades que propuseram ao governo federal Medida Provisória (MP) para prorrogar a permanência de médicos estrangeiros por mais três anos.

Comemorada pelas entidades, a assinatura da MP pela presidente afastada Dilma Rousseff, no entanto, ainda corre o risco de ser revogada em apreciação pelo Congresso, que tem um prazo de 60 dias prorrogáveis por mais 60 para analisar a medida. Ou seja, os médicos estrangeiros podem, ainda, ser desvinculados do programa, deixando pelo menos sete mil vagas abertas só nesse ano.

Em entrevista, o ministro da Saúde Ricardo Barros não confirmou se há ou não alguma definição, por parte do governo, sobre a anulação da MP.

Pela MP, médicos cubanos também podem permanecer no país por mais três anos. No entanto, uma fonte ligada ao Ministério da Saúde (MS) que pediu para não ser identificada confirmou que a situação dos cubanos permanece indefinida porque Cuba ainda não se manifestou sobre a permanência de seus médicos com a mudança no governo brasileiro.

Especula-se uma renegociação do contrato feito entre Brasil e Cuba por meio da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), responsável por recrutar os profissionais. A ideia seria manter médicos estrangeiros apenas em vagas difíceis de preencher, como em distritos sanitários estrangeiros.

Hoje, estrangeiros respondem por 70% do total de profissionais do programa, a maioria deles são médicos cubanos. No Paraná, dos 967 contratados, 691 vieram de Cuba (71,4%); 117 são médicos brasileiros formados em outros países ou estrangeiros e 159 são médicos formados no Brasil. Em algumas cidades, só há estrangeiros. Em Ponta Grossa, por exemplo, cidade com maior número de profissionais pelo programa no Brasil, são 60 cubanos e três brasileiros.

Só brasileiros

A questão que os números levantam é: um Mais Médicos exclusivamente brasileiro é possível?

Para Barros, sim. “Daremos preferência aos médicos daqui. Vamos valorizar nossos profissionais. Como foram criadas muitas faculdades de medicina nos últimos anos, a médio prazo vamos conseguir equilibrar a participação até termos um Mais Médicos só de brasileiros”, disse.

Na avaliação do professor da UFPR Edevar Daniel, coordenador do Mais Médicos no Paraná, o programa “depende” de estrangeiros apenas porque médicos brasileiros apresentaram resistência ao projeto no início. Ele é cauteloso quanto à dispensa dos médicos de fora.

“Acho que quando o ministro diz que pretende diminuir o número de estrangeiros, isso depende do interesse do médico brasileiro. Não sei se a gente consegue suprir todas as vagas somente com médicos brasileiros. O governo vai ter que dar uma resposta se não houver esse interesse porque se os médicos estrangeiros forem dispensados e não houver substituição, a população e os municípios serão penalizados”, pondera.

Já o diretor da Atenção Primária em Ponta Grossa, Robson Xavier, aponta o número insuficiente de profissionais formados para a Atenção Básica como outra dificuldade. “Hoje o Brasil não tem condição de, tão somente com médicos brasileiros, assumir o Mais Médicos. O incentivo à abertura de novos cursos de medicina é muito recente.”

Segundo o MS, o quantitativo de vagas ocupadas por médicos cubanos se mantém fixo desde 2014 – em 2015 e 2016 as vagas ofertadas foram ocupadas por brasileiros. O ministro disse ainda que, se for preciso, o Brasil continuará chamando estrangeiros.

Como funciona

A contratação de profissionais para o Mais Médicos é sempre feita por edital.

Vagas
Demandadas pelos municípios, que repassam o número de médicos necessários para completar as equipes de saúde da família.

Daqui
De acordo com a Lei 12.871/2013, as vagas são ofertadas primeiro para médicos brasileiros. O edital oferta vagas primeiro para médicos brasileiros; as remanescentes são então oferecidas para médicos brasileiros formados no exterior; não sendo preenchidas todas as vagas, abre-se chamada para médicos estrangeiros.

De Cuba
Se, ainda assim, sobrarem vagas, uma quarta chamada é feita para convocar médicos cubanos a partir de um acordo entre os países intermediado pela Organização Pan-Americana de Saúde (Opas).

Médicos esperam melhorias para aderir

De acordo com Luiz Ernesto Pujol, presidente do Conselho Regional de Medicina do Paraná (CRM-PR), os médicos brasileiros não demonstraram interesse ao programa devido às condições precárias de trabalho. A resistência, no entanto, diminuiu após a implementação de mudanças nas regras. Hoje, médicos brasileiros que participarem do Mais Médicos recebem uma espécie de bônus na prova para cursos de residência médica.

Agora, com a recente prorrogação da permanência de médicos estrangeiros sem revalidação do diploma, a categoria voltou a se indispor com o governo.

“Lutamos para que as condições da saúde sejam melhoradas. Aí será possível um Mais Médicos só com brasileiros. Como médico, não tenho possibilidade de trabalhar porque temos médicos de fora. Esperamos que a sensibilidade do novo governo corrija isso. Não queremos acabar com o programa, mas que ele seja feito com médicos daqui”, declarou.

Ainda assim, uma fonte ligada à coordenação do Mais Médicos no Paraná, que pediu para não ser identificada, disse não acreditar que um programa feito apenas por brasileiros seja possível.

“Antes do programa, 700 municípios do Brasil nunca tinham tido médicos. São localidades no interior do país, afastadas, onde é muito difícil colocar médico. Mesmo em Curitiba: os médicos do programa estão em localidades como a Caximba, por exemplo. A procura de brasileiros tem aumentado, o que é bom, mas um programa só com brasileiros não parece possível.”

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