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STF julgará ação do PSOL que pretende fomentar ideologia de gênero nas escolas
Edson Fachin, relator da ação ajuizada pelo PSOL a ser julgada nesta quinta-feira (17)| Foto: Fellipe Sampaio/STF

Nesta quinta-feira (17), o Supremo Tribunal Federal (STF) julgará uma ação ajuizada pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), que busca fomentar pela via judicial a ideologia de gênero para crianças e adolescentes em todas as escolas brasileiras, tanto públicas quanto privadas.

A justificativa do partido é de que a medida estaria relacionada ao combate ao bullying “homotransfóbico” no ambiente escolar. Entretanto, a coibição de bullying, violências e discriminações contra crianças e adolescentes já faz parte das atribuições das instituições de ensino e está prevista tanto constitucionalmente quanto na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB).

O julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5668 havia sido retirado de pauta em novembro de 2020 pelo ministro Luiz Fux, na época presidente do STF. A decisão ocorreu após encontro de Fux com deputados das frentes parlamentares evangélica e católica. No entanto, no último sábado (12), a presidente da Corte, Rosa Weber, decidiu colocar a ação, que tem como relator o ministro Edson Fachin, novamente em pauta.

O ajuizamento da ação no STF representa uma nova cartada do PSOL para fomentar a ideologia de gênero nas escolas após terem sido frustradas tentativas diversas no Legislativo e no Executivo. Durante as discussões do Plano Nacional de Educação (PNE), aprovado pelo Congresso Nacional em 2014, e de planos de educação estaduais e municipais, discutidos em 2015, partidos e parlamentares de esquerda tentaram, sem sucesso, incluir nas diretrizes dos documentos menções às palavras “gênero”, “identidade de gênero” e “orientação sexual”.

Houve investida semelhante nas discussões sobre a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), homologada em 2017 após ser amplamente discutida com a participação de entidades representativas da educação básica nas esferas federal, estadual e municipal. O tema novamente ficou de fora.

O partido entende que a retirada desses termos tem sido interpretada pelas escolas como uma proibição à abordagem da ideologia de gênero e pede ao Supremo “interpretação constitucional” ao Plano Nacional de Educação, o que, caso validado pela Corte, implicaria na obrigatoriedade às escolas de abordar o tema.

Ação propõe abordagem de sexualidade contrária à biologia humana nas escolas

Inicialmente o texto apresentado à Corte argumenta que deve ser combatida a noção de que a escola seria uma espécie de “curso técnico” voltado à aprovação de adolescentes no vestibular e pede o reconhecimento do dever constitucional das escolas de combater “a perseguição de crianças e adolescentes LGBT”.

Dentre as reivindicações apresentadas pelo PSOL também estão obrigar as escolas a chamar pelo nome social crianças e adolescentes que se identifiquem com o gênero oposto ao sexo biológico; permitir que se vistam e se portem de acordo com sua “identidade de gênero transgênera”; e reprimir as discriminações por orientação sexual, identidade de gênero e gênero que lhes forem denunciadas.

O livre uso dos banheiros escolares de acordo com o gênero com que alunos venham a se identificar não é pedido expressamente na ação, apesar de o partido mencionar, na petição, que alunos travestis e transexuais costumam abandonar a escola por, dentre outras medidas, não poderem usar o banheiro do sexo com que se identificam.

No texto, o PSOL questiona a visão binária – e, portanto, biológica – da sexualidade humana, criticando o fato de que “pessoas que nascem com um pênis sejam designadas como ‘meninos’ e pessoas que nascem com uma vagina sejam designadas como ‘meninas’ pela sociedade”.

Na prática, fomentar pela via judicial tal visão nas escolas representaria ampliar ainda mais a difusão a crianças e adolescentes das chamadas “questões de gênero”, que sustentam que as diferenças entre masculinidade e feminilidade decorrem de “construções sociais” e não da biologia humana. Na ação, o PSOL alega que impulsionar tal perspectiva significa “desbiologizar as normas de gênero socialmente impostas e que cotidianamente geram o machismo social e institucional”.

Segundo o partido, a oposição ao negacionismo da biologia humana frente ao assunto, vinda em especial dos pais e familiares dos alunos, seria capitaneada “pelos setores fundamentalistas e conservadores da sociedade” e “por cristãos fundamentalistas que querem impor sua ideologia moralista às escolas”.

Ideologia de gênero em sala de aula foge às necessidades pedagógicas, diz jurista

Na avaliação do professor de Direito Constitucional e doutor em Direito pela Universidade de São Paulo (SP), Antônio Jorge Pereira Júnior, uma consequência de eventual julgamento da ação como procedente seria antecipar determinados assuntos relacionados à sexualidade para o universo infanto-juvenil. “Estamos mexendo com o imaginário, com a dimensão psíquica das crianças. Ao trabalhar questões de gênero para esse público, pode haver antecipação de experiências, tornando as crianças familiarizadas com temáticas que escapam às suas necessidades pedagógicas”, declara.

O professor também reforça que já há obrigatoriedade às escolas quanto a combater bullying, além de existir previsões pedagógicas e legais relacionadas à valorização de aspectos como solidariedade e respeito a todas as pessoas. Pereira Júnior questiona, ainda, se os docentes estariam preparados para abordar questões tão sensíveis em sala de aula. “Qual seria a formação adequada para que o professor possa dar aulas de questões de gênero? Nessa lacuna podem entrar manipulações diversas, ainda mais em grupos vulneráveis como as crianças”, destaca.

Em nota enviada à Gazeta do Povo, a Associação Nacional de Juristas Evangélicos (Anajure), que figura dentro do processo como amicus curiae, reforçou que o combate ao bullying nas escolas já está previsto em lei e disse esperar que a realização do julgamento em intervalo de tempo curto após sua inserção em pauta não seja um empecilho para a promoção de um debate plural da Corte com a sociedade civil, com a devida apreciação dos argumentos de seus diversos representantes.

“A Anajure entende que o Plano Nacional de Educação já contempla disposições voltadas ao combate do bullying, como a previsão ao princípio geral de não discriminação, o que deve gerar a improcedência da ação. Ressalte-se, ainda, que a demanda pode gerar efeitos negativos sobre a liberdade religiosa e de expressão, que devem ser considerados pela análise da Corte. O necessário combate ao bullying que afeta pessoas LGBT certamente deve ser norteado por noções de respeito e não discriminação, mas não deve implicar em restrições indevidas ao discurso religioso”, diz a nota.

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