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Zanin
O ministro do STF Cristiano Zanin.| Foto: Carlos Moura/SCO/STF.

Os primeiros passos de Cristiano Zanin no Supremo Tribunal Federal (STF) estão dificultando as tentativas de etiquetar o novo ministro ideologicamente. Com seus votos e decisões, Zanin já deu motivos para decepcionar e animar esquerda e direita, e se tornou o ministro mais imprevisível do Supremo.

Na semana passada, um dia após arquivar uma ação contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL-RJ) por omissão na compra de vacinas – o que irritou parte da esquerda –, Zanin votou contra o marco temporal – o que incomodou a oposição, que quer aprovar o marco no Congresso.

Após seu voto no julgamento sobre a descriminalização das drogas, militantes de esquerda manifestaram sua indignação contra o ministro nas redes sociais. Na justificativa, Zanin contrariou um dogma esquerdista: o de que a descriminalização ajudaria a combater os problemas associados ao uso de drogas.

"A mera descriminalização do porte de drogas para consumo, na minha visão, apresenta problemas jurídicos e ainda pode agravar a situação que enfrentamos nessa problemática do combate às drogas. A descriminalização, ainda que parcial das drogas, poderá contribuir ainda mais para o agravamento desse problema de saúde", afirmou.

No julgamento do STF que, por 9 votos a 1, equiparou a homofobia e a transfobia à injúria racial, Zanin foi o único a votar contra a decisão, dando uma razão técnica para seu posicionamento. "O mérito do julgamento não poderia ser alterado por embargos de declaração, que servem apenas para esclarecer omissão, obscuridade, contradição ou erro material no julgado. E, na visão do ministro Zanin, não haveria a obscuridade apontada pelo ministro Fachin, relator do recurso", justificou sua assessoria depois da forte reação de esquerdistas ao voto.

O novo ministro também foi contra a aplicação do princípio de insignificância para um furto no valor de R$ 100 reais, em julgamento da Primeira Turma do STF em que Zanin esteve de acordo com a maioria do colegiado.

O ministro indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi ainda o responsável por desempatar o julgamento do STF que definiu que integrantes de guardas municipais fazem parte do sistema de segurança pública – e podem, com isso, fazer policiamento de vias e executar prisões em flagrante. A decisão também foi criticada por militantes esquerdistas.

Além disso, no julgamento em que o STF acatou, por 7 votos a 4, uma série de pedidos da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) por ações estatais de combate à violência policial contra comunidades indígenas no Mato Grosso do Sul, Zanin foi um dos quatro ministros que votaram contra as solicitações.

Esquerdistas reagiram a esse voto acusando o magistrado de ser contra as causas indigenistas, e temiam que, no julgamento do marco temporal, Zanin fosse no mesmo sentido. O ministro, contudo, foi contra o marco.

A pressão sobre Zanin é, em parte, uma estratégia da esquerda para viabilizar a indicação de um ministro ideologicamente mais radical na segunda escolha de membro do STF que Lula fará neste ano. "Mais do que nunca: precisamos de uma ministra negra e progressista no STF!", disse recentemente a deputada federal Erika Hilton (PSOL-SP).

Zanin é conservador no sentido jurídico, mas não nos costumes, observam juristas

Para o jurista Adriano Soares da Costa, ex-juiz de Direito e autor do livro "Instituições de Direito Eleitoral", Zanin "tem tido uma postura técnica, inclusive mais conservadora, sem interpretações criativas". "Conservadora no sentido jurídico, de respeito ao direito positivo", explica.

Ele descarta, no entanto, a tese de que Zanin seja um conservador no campo dos costumes.

Sobre o voto no marco temporal, Soares da Costa considera que Zanin cometeu um erro. "É uma questão que deveria estar a cargo do Congresso Nacional. O STF está criando uma cláusula pétrea que visa a previamente afirmar que mesmo uma emenda constitucional estaria impedida de tratar da matéria", observa.

Alessandro Chiarottino, doutor em Direito Constitucional pela USP, concorda que o voto sobre o marco temporal não teve o mesmo rigor técnico que outras manifestações do novo ministro.

"Eu até acredito que Zanin será mais 'técnico', contudo, a votação do marco temporal acende um sinal amarelo, uma vez que houve pressões, de dentro e de fora do PT, sobre Zanin", comenta. "Os seus argumentos utilizados na ação do marco temporal foram um desfile de conceitos ideológicos. Portanto, acho que podemos ver o copo apenas meio cheio", complementa.

O jurista considera, por outro lado, que o posicionamento de Zanin no julgamento sobre a descriminalização da maconha foi tecnicamente bem fundamentado, o que torna previsível a pressão que ele tem sofrido por setores da esquerda.

Nas redes sociais, o novo ministro já foi situado em pontos bastante diversos do espectro ideológico, o que evidencia a dificuldade de impor rótulos à sua atuação até aqui.

"Zanin arquivou processo contra Bolsonaro por omissão na compra de vacinas. Para o desespero petista, o ministro parece ser mais legalista do que militante. Maior cavalo de Troia já visto!", comemorou recentemente o direitista Rubinho Nunes (União), vereador de São Paulo.

"Tem que ser muito ingênuo para acreditar que o Zanin, ex-advogado de um ladrão condenado, é conservador. Ele votará 'certo' por um bom tempo pra mostrar que não tem rabo preso com o Lula e que o STF tem oposição. Até começar a "meter o ferro" sem dó na direita", disse uma usuária em uma postagem com milhares de curtidas.

"Zanin, o careta: caçula foi mais conservador com a maconha do que o 'vovô' Gilmar. O STF construiu um consenso para mitigar o hiperencarceramento de jovens negros, tema caro à esquerda para o qual o nomeado por Lula mostrou estar se lixando", postou uma militante de esquerda sobre o julgamento da descriminalização da maconha.

"É petista chamando Zanin de nazista. É bolsonarista se alegrando dizendo que Zanin é conservador. Só uma ala psiquiátrica para resolver isso", afirmou outra usuária em uma postagem com mais de mil curtidas.

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