Senado Federal deve ser respeitado como a instância final do processo de impeachment, afirmam especialistas.| Foto: Francisco Stuckert/Estadão Conteúdo

A possibilidade recorrer a foros internacionais para contestar o processo de impeachment terá pouca eficácia jurídica e, mais, pode ser considerada um desrespeito à soberania nacional. Não existe em âmbito internacional uma estrutura jurídica à qual seja possível recorrer do resultado da votação. A possibilidade cogitada seria formação de um “tribunal internacional” para acompanhar o processo impeachment é uma possibilidade aventada pelo governo, caso o Senado aprove a continuidade da ação contra a presidente.

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No âmbito das cortes internacionais, a Corte Interamericana de Direitos Humanos - que chegou a ser citada como alternativa no processo do mensalão - como o próprio nome já diz, refere-se à garantia de direitos fundamentais e tem o objetivo de aplicar e interpretar a Convenção Americana de Direitos Humanos.

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Com relação ao direito penal, o Tribunal Penal Internacional julga indivíduos acusados de crimes contra a humanidade; e a Corte Internacional de Justiça analisa litígio entre estados. O professor de direito constitucional da UFPR Egon Bockmann Moreira explica que esses tribunais se referem a sanções penais e não podem se pronunciar com relação a sanções políticas decorrentes de atos criminosos, como seria o caso do impeachment.

Sem um tribunal constituído que pudesse julgar o tema, a alternativa cogitada poderia ser a formação de uma comissão de juristas estrangeiros para acompanhar o caso. A consulta a especialistas em direito estrangeiros sobre o processo, contudo, não teria qualquer relevância jurídica. Tal medida poderia, no máximo, ter impacto político. Além disso, segundo especialistas em direito e política internacional, a iniciativa pode se configurar como um desrespeito à soberania nacional.

Ministros do Supremo Tribunal Federal já se pronunciaram diversas vezes dizendo que não interfeririam em questões relacionadas ao mérito do processo de impeachment, e apenas iriam dirimir dúvidas relacionadas ao rito.

Moreira e o especialista em política internacional Heni Ozi Cukier ressaltam que, se nem a corte suprema do país pretende interferir no processo, não faria sentido estrangeiros quererem se pronunciar. Para eles, até mesmo a formação de um grupo de observadores seria uma violação da soberania nacional.

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“Se é um ato passível de controle externo [ao Congresso] quem pode dizer qual é o tipo de controle externo é o Supremo”, afirma Moreira.

Diante dessa possibilidade de criação de uma comissão que avaliaria o andamento do processo e daria seu parecer, surgem algumas questões como quem escolheria esses juristas e quais os critérios adotados.

“Quem seria esse tribunal? Eleito por quem? Sob que jurisdição?”, questiona Cukier, que é cientista político e professor da FGV. Segundo ele, que já trabalhou no Conselho de Segurança da ONU, só em situação de guerra, em países em reconstrução ou onde não existe governo é que uma alternativa dessas faria sentido.

“Tudo que está acontecendo tem a participação dos três poderes. O Legislativo faz seu papel dentro de um rito definido pelo Judiciário, e o Executivo está exercendo o direito de defesa”, observa o professor da FGV. Para ele, não haveria motivação para que o caso fosse questionado no exterior. “Duvido que isso ganhe corpo em qualquer esfera internacional”, afirma Cukier.

É comum em processos eleitorais, que observadores do exterior acompanhem o andamento das votações. Mas os especialistas consultados afirmam que o processo de impeachment é diferente. “Não é um processo eleitoral em que normalmente se aceitariam observadores”, diz Moreira.

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Efeito moral

“Esse ‘tribunal’ pode ter efeito moral, chamar atenção, como forma de denúncia, mas não tem força jurídica para alterar a decisão do Senado, seja ela qual for”, analisa o professor de direito constitucional Zulmar Fachin. Ele enfatiza que Constituição atribuiu força jurídica ao Senado Federal para tomar esta decisão.

Fachin diz, ainda, que não conhece experiência semelhante a essa proposta de “tribunal internacional” em outros países que tenham passado por crises institucionais e completa: “Processos de impeachment são muito raros, aqui no Brasil é que estão se tonando comuns”.