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O senador Renan Calheiros (MDB-AL) propôs PEC que limita a liberdade de expressão no Brasil.
O senador Renan Calheiros (MDB-AL) propôs PEC que limita a liberdade de expressão no Brasil.| Foto: Pedro França/Agência Senado.

A proposta de emenda à Constituição do senador Renan Calheiros legaliza o “inquérito do fim do mundo”, derroga a cláusula pétrea da livre manifestação do pensamento, cassa direitos civis e políticos e transforma o Supremo em tribunal para crimes políticos e de opinião. Ganhou o apoio de 33 senadores e o presidente do Senado enaltece a iniciativa. O relator será o senador Davi Alcolumbre. Apresentada como uma lei geral contra a intolerância política, a proposta contém intolerância à crítica, às liberdades, ao direito de protestar por parte do cidadão, que é origem do poder, a quem os políticos, as autoridades, as instituições de Estado devem servir e escutar. Em suma, a proposta é uma abolição final da democracia, tão ferida nesses últimos anos quanto a própria Constituição.

A proposta confere ao Supremo, que deveria ser um tribunal constitucional, a atribuição de julgar “infrações contra o Estado Democrático de Direito”. Parece ironia, pois o Supremo criou um inquérito sem Ministério Público, em que julga pessoas sem foro privilegiado, e em que é vítima, delegado, promotor e juiz ao mesmo tempo – o que é exatamente o abandono do devido processo legal, caraterística do Estado de Direito. Pelo projeto, é crime xingar políticos e autoridades, como se já não existissem no Código Penal punições para a injúria, a calúnia e a difamação. Outra ironia é que tanto o autor da proposta quanto 15 de seus apoiadores são investigados ou processados por crimes contra os pagadores de impostos.

Tem cinco propostas o “pacote de defesa da democracia”, que obviamente trata de proteger os políticos contra mandados de busca e apreensão perto de eleições, zelando por suas reeleições. Uma dessas propostas tira o poder do presidente da República de escolher livremente seu ministério, proibindo que o ministro da Defesa seja militar da ativa ou da reserva. Quer dizer, pressupõe que um militar na Defesa seja um risco para a democracia. Essas propostas absorvem a legislação feita pelo TSE e pelo Supremo – que não são órgãos legislativos – punindo aquilo que, no ponto de vista do interessado, seja falso nas redes sociais, cortando a remuneração de trabalhadores do mundo digital e bloqueando suas contas nas plataformas. Tribunais da verdade, como em ficção orwelliana. Deputados e senadores, que pela Constituição são invioláveis por quaisquer palavras, já perderam suas prerrogativas, sem que isso causasse escândalo no parlamento e na mídia.

Parte dessa “opinião pública” está satisfeita com a censura, porque ela atinge sua concorrente rede social. Tampouco se importa com a Constituição, que é a âncora do Estado de Direito. Usa de bom grado a mordaça e ainda quer impô-la aos livres. O cerco começou há quatro anos e vai se fechando. O Brasil vai ficando parecido com outros países latino-americanos. A cidadania não percebeu, pois boa parte foi desinformada. Muitos ficaram hipnotizados por suas fontes de notícias e só acordaram nas eleições, mas já era tarde. Só agora descobrem que a Constituição foi esfarrapada – e a pandemia foi o pretexto útil. Ironicamente, um deputado foi preso porque supostamente pedia a volta do AI-5. E aí está ele, camuflado de “defesa da democracia”, tática dos tiranos contemporâneos.

Conteúdo editado por:Marcio Antonio Campos
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