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Império Romano
Associo o Império Romano à ideia de decadência civilizacional. E você?| Foto: Pixabay

Sexta-feira passada (15), me deparei com um vídeo em que uma moça se dizia surpresa ao descobrir que o namorado pensava com frequência... no Império Romano. Mais surpresa ainda ela ficou ao descobrir que os amigos do namorado também pensavam com frequência no Império Romano. Parece que essa é uma daquelas características masculinas não mapeadas pela medicina. Ou seria pela ideologia de g...? Ah, deixa pra lá.

O fato é que, antes de perguntar se você, leitor com cromossomos XY, pomo-de-adão e níveis de testosterona entre 249 a 836 ng/dL*, pensa com frequência no Império Romano, preciso confessar: por causa da pergunta viral, também eu me dei conta de que penso, e muito, no Império Romano. Quase todos os dias! Aliás, estava pensando agorinha mesmo, antes de começar a escrever este texto.

Conversa vai, conversa vem, outros amigos (cromossomos XY, etc.) se mostraram surpresos ao perceberem que pensam, e muito, no Império Romano. Mas não só. De acordo com o DataPolzo, o Império Helênico também aparece com frequência na mente de alguns dos meus amigos, notadamente os mais sofisticados. E é claro que a essa questão histórico-metafísica se segue a pergunta de um milhão de rúpias: por que nós, homens, pensamos tanto no Império Romano?

Ao que parece, a teoria dominante tem a ver com o arquétipo do guerreiro. O arquétipo estaria tão enraizado na psiquê masculina que, ao nos vermos cercados por uma cultura que negligencia esse nosso lado guerreiro, nós, homens, nos sentiríamos natural e constantemente atraídos por um passado idealizado, no qual a figura do guerreiro era respeitada. Isto é, pelo Império Romano. Ou pela imagem dele na cultura pop.

Seremos?

Pode ser. Mas não no meu caso. Se penso constantemente no Império Romano, e penso, é justamente por sentir que vivo uma decadência civilizacional semelhante à da consagrada em livros e filmes sobre aquele tempo. A briga ilógica pelo poder, a truculência, a vulgaridade, a exacerbação da sexualidade, o hedonismo, a perversidade – e, por fim, a impotência diante da inevitável invasão dos bárbaros, que em pouco tempo transformaram em ruína tudo o que hoje entendemos por “cultura clássica”.

É inevitável: muitas vezes me vejo como um dos centenas de cronistas que, naquela época pré-Gutenberg, se sentavam à luz do candeeiro para escrever, com pena sobre o pergaminho, sobre a vida cotidiana. Textos que se perderam ao longo de séculos de incontáveis saques & pilhagens ou que foram destruídos em bibliotecas precárias, por sua vez consumidas em incêndios ou desastres naturais. Cronistas cujas observações diárias não serviram para nada.

Pensar no Império Romano, pois, me ajuda a pensar na brevidade dessas nossas lutas que às vezes nos parecem eternas. No ridículo das nossas pretensões mundanas. De quebra, me ajuda a pensar na importância presente não só do meu trabalho, mas sobretudo das minhas ações enquanto homem, pai, marido e amigo. Porque é no aqui e agora que atuamos para amar e servir as pessoas próximas – e vivas.

Se serve de consolo, porém, quando penso na nossa decadência civilizacional também penso no Império Britânico, mais recente. No Otomano, só por diversão. No Norte-americano, ladeira abaixo. Até no Brasil de D. Pedro II eu penso. Não com nostalgia – que é a admiração infundada por um tempo que não vivi nem jamais viverei. Penso para tentar tirar lições desses impérios caídos todos. Por fim, penso nesses períodos de expansão territorial e prosperidade na ilusão, ou talvez esperança infundada, de que seremos capazes de aprender com os erros dos nossos ancestrais remotos.

Seremos, né? Me diz que seremos. Por favor, diz que sim, vai.

Asterisco

* O meme que deu origem a este texto diz que o discutível privilégio de pensar com frequência no Império Romano é masculino. Mas fiz uma pesquisa entre as mulheres que me cercam e descobri que elas também pensam no Império Romano. Não todos os dias. Nem toda semana. Mas pensam. E aqui entraria alguma piada com sandália gladiador, enfeites nos cabelos, Laura Muzarela, Nero, Calígula, Cleópatra e Messalina. Mas o caso é que os bárbaros já estão às portas da cidade, emporcalhando os palácios de mármore com suas leis antipiada, leis cheias de ressentimento e selvageria. Então é melhor ficar quieto.

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