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Boeing 737 Max da Southwest Airlines, estacionados no aeroporto de Victorville (EUA)
Boeing 737 Max da Southwest Airlines, estacionados no aeroporto de Victorville (EUA)| Foto: AFP

Em uma crise, o tempo não está do seu lado. Uma crise cria um vácuo, um vazio de informações, que de uma forma ou outra é preenchido. Quanto mais tempo uma empresa ou outra entidade espera para se comunicar em meio a uma crise, mais provável que esse vazio seja preenchido pelas criticas. Foi exatamente o que aconteceu com a Boeing.

Em 10 de março, o voo 302 da Ethiopian Airlines caiu perto de Addis Ababa, poucos instantes após decolar, matando as 157 pessoas a bordo. Foi o segundo 737 Max a cair em quatro meses, levando o número de mortes a cerca de 350 mortos.

Tenho sido executiva e professora de gerenciamento de crise de comunicações por mais de uma década. Uma coisa que tenho certeza que em crises que envolvam perdas de vidas, é importante ser compassivo, ter empatia e cuidadoso.

Entretanto, nos dois dias seguintes ao acidente com o avião da Ethiopian Airlines, a Boeing cometeu deslizes que podem ter efeito de longo prazo em sua reputação e credibilidade.

Muito pouco, muito tarde

O problema-chave com a abordagem da Boeing é que a sua resposta inicial foi muito defensiva, lenta e passiva, sugerindo uma falta de abertura e de transparência.

Por dois dias, o CEO da Boeing, Dennis Muilenburg insistiu que os 737 Max eram seguros, mesmo quando país após país determinavam que os aviões permanecessem no solo. Então, no dia 13, quando a Administração Federal determinou o mesmo, a Boeing sustentou que seus aviões eram seguros.

Mas, apesar desses comunicados e dois tuítes de Muilenburg, os executivos de alto escalão da Boeing permaneceram em silêncio.

O silêncio reflete passividade e sugere que a organização não está no controle nem tentando tomar conta da situação. O silêncio permite que outros tomem conta do assunto e tomem conta da narrativa.

Como resultado, a Boeing foi pega na defensiva em uma narrativa que sugere que a companhia estava mais interessada em lucros do que nas pessoas que se apressavam em produzir um avião que representa cerca de um terço de sua receita.

Esta narrativa foi impulsionada por outras companhias, imprensa, empregados e defensores da segurança na aviação, como o comandante Chesley “Sully” Sullenberger.

Sendo proativo

A Boeing poderia ter adotado uma postura mais proativa, como tomar a iniciativa de deixar seus aviões no solo.

Contudo, a Boeing hesitou, não foi transparente e não assumiu qualquer responsabilidade pelo que aconteceu, deixando para as companhias aéreas, países e órgãos reguladores a decisão para deixar o 737 Max no solo.

Segundo o pesquisador em gerenciamento de crises de comunicação Timothy Coombs, a abertura corporativa pode ser definida como a disponibilidade da empresa em relação aos meios de comunicação, a disponibilidade em divulgar a informação e a honestidade. A Boeing falhou nos três aspectos.

E os poucos comunicados que fez estão cheios de lugares-comuns, como “segurança é um valor chave”, e a falta de informações significativas. Em seu comunicado após a FAA determinar que os 737 Max permanecessem em solo, a Boeing sugeriu que estava cumprindo a ordem “devido a uma grande precaução”. Mas a Boeing não tinha escolha. A decisão fora tomada.

A Boeing agora está na defensiva e, no futuro, terá de se opor à narrativa prejudicial que circula na opinião pública. Tem muito trabalho pela frente. As investigações mostram que as pessoas acreditam rapidamente no pior das organizações, o que alimenta a especulação negativa.

Turbulências à frente para a Boeing

O desafio que a Boeing vai enfrentar é grande.

Muitos de seus aviões continuam parados, o que pode custar cerca de US$ 5 bilhões à Boeing, segundo estimativas preliminares. A Boeing suspendeu as entregas do 737 Max e pedidos para futuros aviões estão em risco. Recentemente, ela recebeu o primeiro pedido de cancelamento. A carteira de pedidos chega a 4.500 aviões.

A Boeing tem uma coisa em seu favor: ela construiu sólidas relações com autoridades do governo em Washington ao longo dos anos.

Mas estas relações, que poderiam ser úteis e aliviar a pressão sobre a companhia em algum grau, estão sob estresse, pois o Congresso e o Departamento de Justiça estão investigando como a Boeing obteve a certificação de voo do 737 Max.

Virando o jogo

Então, é tarde para virar o jogo?

Não acredito que seja, mas a Boeing precisa imediatamente mudar sua estratégia de passiva e fechada para ativa e aberta.  Em lugar de esperar que parlamentares ou investigadores cheguem ao fundo das coisas, o que poderia ser devastador para a fabricante de aviões, o fabricante deveria recompilar toda a informação relevante e divulgar a maior quantidade possível, ainda que seja prejudicial.

A fabricante de aviões deveria ser capaz de responder questões como o que ocorreu, quem é o responsável e o que aconteceu. A melhor forma de mostrar seu comprometimento com a segurança é não com chavões, mas com ações concretas que revelem abertura e transparência. Pesquisas mostram que transparência e honestidade são chaves para uma comunicação efetiva em uma crise.

Em última instância, a empresa precisa mostrar que as vidas dos passageiros em seus aviões são mais importantes que lucros ou sua reputação. E no longo prazo, fazer isto ajudará a companhia a recuperar a confiança que foi perdida.

Todos nós esperamos que aviões sejam seguros. A Boeing violou tais expectativas.

A decisão sobre como e quando o 737 Max estará de volta aos céus - e quanto isto custará à Boeing - será feita por companhias aéreas, agências reguladoras e legisladores. E elas irão escutar os consumidores e a população.

Se a opinião pública considerar a Boeing culpada de colocar suas vidas e as das suas famílias em risco, estes agentes dificilmente considerarão apoiar a companhia.

*Kelli Matthews é instrutora sênior de jornalismo e comunicação da Universidade do Oregon (EUA)

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