Fachada do Ministério da Educação (MEC).| Foto: Geraldo Magela/Agência Senado
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O lançamento da nova Política Nacional de Educação Especial (PNEE) rendeu duras críticas ao Ministério da Educação (MEC), acusado de retrocesso com a medida. Em debate acalorado - muitas vezes tendo como pano de fundo razões político-partidárias e não evidências científicas - especialistas e famílias se dividem com relação aos efeitos da inclusão total na educação. Um caderno explicativo que detalha a PNEE deve ser divulgado nos próximos dias.

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Para o MEC, não há críticas fundamentadas em pesquisas que possam provar que a nova política proposta pelo governo federal acarretará prejuízos sociais e cognitivos aos alunos. A pasta defende que o objetivo é justamente o contrário, fornecer subsídios para aprimorar o aprendizado cognitivo de alunos que não têm sido beneficiados com a inclusão em salas regulares.

Abaixo, entenda, a partir do que se sabe hoje sobre a prática de ensino de crianças com necessidades especiais, quais são as luzes e as dúvidas que ainda pairam sobre a nova política.

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Antes de tudo: o direito à matrícula em escola regular permanece absoluto

A nova PNEE continua a dar preferência à modalidade de educação escolar oferecida na rede regular de ensino a estudantes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação. Também está em vigor o previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), em seu artigo 55, sobre a obrigação que pais têm de matricular filhos na rede regular de ensino.

Ou seja, o ideal de ter "todas as pessoas incluídas", com prevalência para a rede regular, permanece sendo um direito inquestionável e absoluto, amparado pela Constituição, em seu artigo 208: "O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de [...] atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino".

O que o MEC pretende, com a nova política, é oferecer flexibilidade, aos alunos que necessitem, para a criação de alternativas educacionais além das que já existem - o que hoje não ocorre e, inclusive, é desaconselhado. O governo propõe um olhar mais individualizado e a promoção de práticas interventivas para que a pessoa com deficiência tenha ganhos em todas as áreas do desenvolvimento humano.

O pressuposto da mera "boa vontade" na educação especial: evidência ou ideologia?

Ao lançar a nova PNEE o governo quer ajustar e dar força de lei ao que, desde 2008, era tão-somente um documento de 15 páginas publicado no site do MEC. A chamada "Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva Inclusiva" não tinha caráter de norma legal. "Nós não gostaríamos que fosse assim, gostaríamos que fosse um decreto. Isso, sim, assegura direitos", afirma Nídia Limeira de Sá, diretora de Educação Especial na pasta.

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Em linhas gerais, o documento era composto a partir da chamada perspectiva de "inclusão total", espécie de radicalização da discussão da educação especial, cuja máxima é a de que todos podem e devem ser matriculados na escola regular. Sem qualquer ressalva, afirma que essa seria a melhor opção de ensino para todos os estudantes. Essa radicalização entende, inclusive, que não são necessárias "adaptações" para atender as singularidades dos alunos.

O conceito passou a ser amplamente disseminado com a Declaração de Salamanca, resolução da ONU de 1994 sobre educação especial, que afirma que "escolas comuns representam o meio mais eficaz para combater as atitudes discriminatórias". Na realidade, a história passou a mostrar que recomendações tais como "todos os estudantes devem estar juntos" derivam da ideologia, e não da evidência empírica de que esta seja a melhor prática para todos os estudantes.

O debate também foi influenciado pela decisão da ONU de incluir a máxima "ninguém fica para trás" como um dos objetivos do Desenvolvimento Sustentável na Saúde e Educação.

"O direito de todos estarem juntos não é maior que o direito individual ao desenvolvimento".

Ministério da Educação

Inclusionistas radicais tendem a se basear no pressuposto da mera "boa vontade", ancorados nas ideias do que se considera, hoje, como a mais importante referência no Brasil sobre educação especial, a professora Maria Teresa Eglér Mantoan, da Faculdade de Educação (FE) da Unicamp. A máxima dessa corrente é reparar aspectos culturais de discriminação social e superar a "lógica da exclusão", sem dar grande atenção a como devem ser tratados pormenores de ordem cognitiva (entenda as consequências abaixo). Desconsidera-se, por exemplo, achados das ciências cognitivas que revelam que a neuroplasticidade - capacidade de fazer e desfazer conexões - é única em cada indivíduo. Isso significa que, mesmo quando expostas à mesma aprendizagem, as pessoas aprenderão de maneiras diferentes e singulares.

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Os autores do estudo Full Inclusion: An Empirical Perspective, por exemplo, evidenciam, com bases empíricas, como as singularidades e a possibilidade de efeitos negativos da inclusão em alunos moderados/severos são frequentemente ignoradas pelos defensores da inclusão total. Em geral, os que promovem a inclusão total sugerem que os alunos com disfunções "deem menos atenção à natureza de suas deficiências ou diferenças individuais e, assim, irão se beneficiar da mesma colocação na classe regular".

Mas é precisamente aí que está o problema: ao negligenciar as dificuldades específicas dos alunos, os educadores acabam não dando os recursos personalizados que eles precisam para aprender. Enquanto boa parte da comunidade internacional começa a utilizar achados científicos como insumo para a elaboração de políticas na área, no Brasil o modelo de inclusão total foi apoiado pela academia sem críticas, ao menos durante os últimos 20 anos, sem dispor de uma sólida base de evidências que apoiem sua eficácia (como similarmente ocorreu no campo da alfabetização).

"Esse era o foco: um único tipo de política, que não dava opção para as pessoas e passava o rolo compressor na escolha das famílias. Por não ter base científica, virou uma espécie de religião. Era preciso sair de um modelo monolítico para algo com maior flexibilidade", afirma Vitor Geraldi Haase, professor titular do Departamento de Psicologia da UFMG e doutor em Psicologia Médica pela Ludwig-Maximilians-Universität zu München, na Alemanha.

Por um lado, essa posição "extrema" tem um valor histórico e significativo de promover a universalidade do ensino e aumentar matrículas. "A ideia de 'forçar a barra' para coibir o fenômeno da recusa da matrícula, embora não tenha exatamente acabado, conquistou, inclusive, legislações que punem isso como crime", afirma Lucelmo Lacerda, doutor em Educação pela PUC-SP, pós- doutor em Psicologia pela UFSCar e pai de um menino de 12 anos com autismo severo.

Apesar dessa conquista, contudo, na prática a ideia acaba por não reconhecer a diversidade das pessoas com deficiência. Para Lacerda, há um caráter "nefasto" na política frente a estudantes cuja deficiência é de grau moderado a severo, os quais, eventualmente, podem não se beneficiar da inclusão.

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Tanto Haase como Lacerda apontam para a ausência de evidências que sustentem o modelo mais radical. Com o lançamento da nova PNEE, a Coordenação de Aperfeiçoamento e Pessoal de Nível Superior (Capes) deve abrir uma linha de incentivo a pesquisas que busquem evidências científicas de que os pressupostos da política de inclusão total se sustentam ou em que casos ela seria satisfatória.

Para os especialistas, é fácil compreender os motivos para a rápida e fácil adoção, por parte de entes federativos, de perspectivas como a da inclusão total radical: é uma política barata, que demanda pouquíssimo esforço. De início, elabora-se um currículo com poucas exigências e baixas expectativas e, em seguida, no chão da escola, não é preciso muito.

"Jogar as crianças na escola comum e não fazer nada por elas é o mais barato. É economizar em cima das crianças com deficiência", critica Lacerda. "Não tem inclusão escolar no Brasil. O que temos é simplesmente matrícula [de pessoas com deficiência na escola comum]".

Ele lembra que a antiga política tinha, por exemplo, ao menos dez condenações claras a qualquer tentativa de adaptação para atender melhor os alunos com deficiência em escolas regulares. Isto é, o argumento de que a inclusão teria sido mal feita, até agora, não se sustenta, uma vez que tem sido realizado justamente conforme o que previa a PNEE de 2008: pouca ou nada adaptação para atender estudantes com deficiência.

O documento caracteriza as adaptações como excludentes, paliativas e "soluções utilitárias alheias à realidade educacional". Entre elas, o texto cita práticas como "ensino individualizado para os alunos com deficiência e/ou problemas de aprendizagem; currículos adaptados; terminalidade específica; métodos especiais para ensino de pessoas com deficiência; avaliação diferenciada; categorização e diferenciação dos alunos; formação de turmas escolares buscando a homogeneização dos alunos". Nessa concepção de ensino, a responsabilidade de adaptação ao currículo fica a cargo do aluno.

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"Era só ter um coração bom que a criança aprenderia", diz Lacerda. Para ele, utilizar dinheiro público com o que está provado que não funciona, ou que não se sabe se funciona, deveria ser considerado corrupção.

"A inclusão em classe regular foi feita de maneira irresponsável. É só colocar um monte de crianças em uma sala e a professora que deve se virar, sem receber assistência".

Vitor Haase

Segundo o MEC, "a nova PNE traz uma visão ampliada do atendimento educacional especializado, o qual na Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (2008) foi 'substantivado'".

"Esta ampliação sugere que o preceito constitucional que obriga os sistemas educacionais a oferecerem um atendimento educacional especializado (artigo 208 da CF) diz respeito muito mais à garantia de uma ação pedagógica com especialização técnica para um trabalho específico, o que não se define apenas pelo atendimento educacional especializado nas salas de recursos multifuncionais ou no espaço do contraturno, mas, em todo o processo educacional"

Ministério da Educação

Inclusão é, pedagógica e socialmente, a melhor opção para todos?

Um longo caminho de pesquisas, sob a dificuldade da posição acadêmica refratária à ideia de estudos quantitativos e pesquisas de natureza científica, sobretudo no campo da Pedagogia e da Psicologia - e em especial quando se trata de alunos com deficiência - permitiu achados como os que estão postos a seguir.

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"A academia rejeita qualquer ideia de usar a ciência como ferramenta na educação. E aí se entra em um ciclo vicioso. Na verdade, se você faz uma afirmação cuja natureza não possa ser colocada em teste, vira uma espécie de seita".

Lucelmo Lacerda

Nesse contexto, dois principais erros fizeram com que o Brasil não aplicasse as melhores políticas de educação especial nos últimos anos: 1) a falta de incentivo por parte da Capes a pesquisas dessa natureza e 2) a falta de ferramentas para fazer diagnósticos dos resultados da educação especial.

Hoje, apenas o Censo Escolar traz indicadores que, ainda, se limitam apenas a dados de matrícula e infraestrutura das escolas quanto à acessibilidade. Nunca houve no país diagnóstico do desempenho desses estudantes, tanto quando inseridos nas classes regulares como especiais.

Mas na comunidade internacional, estudiosos como Alisson Gilmour, professora na Temple University, na Filadélfia, arriscaram "tocar na ferida" dessa discussão, cujo pano de fundo, em muitos casos, é ideológico. Com base em pesquisas realizadas em salas de aula nos Estados Unidos, Gilmour afirma que a inclusão, embora seja o modelo mais bem aceito socialmente, nem sempre é de todo proveitosa.

Ainda que a ideia geral da educação especial se baseie na "filosofia da normalização", para ajudar as pessoas com deficiência a levar a vida "mais normal possível", promovendo sua autonomia, independência e capacidade decisória, nem todos os alunos se beneficiam, cognitiva e socialmente, do aprendizado em coletividade.

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Há alunos que, até mesmo no melhor cenário de educação inclusiva e com as melhores adaptações, teriam o aprendizado prejudicado. Sobretudo alunos com deficiências mais severas não conseguem atingir as expectativas de aprendizagens do currículo padrão e demandam um plano de ensino individualizado.

"Há uma grande maioria que se beneficia, sim, do ensino regular. Mas não todos. E quanto aos que não se beneficiam, não se trata simplesmente de eles não colherem benefícios. Mas de colherem malefícios. Eles são prejudicados, como muitos estudos apontam. Do ponto de vista científico, hoje, essa é uma questão absolutamente bem consolidada".

Lucelmo Lacerda

É imprescindível considerar que toda intervenção psicológica tem efeitos colaterais, lembra Haase. "Em geral, não se pensa que essas ações têm efeito, e que apenas os remédios, as vacinas teriam", diz ele. "Temos experiência clínica e dados de pesquisa que mostram que não existe uma política de tamanho único que sirva para todo mundo. Depende muito da criança, da família, da necessidade da família".

Quais seriam os efeitos colaterais possíveis? Por exemplo: "deixar para trás" alunos com deficiência, atrasar seu progresso e desmotivá-los, aumentar o risco de exposição ao bullying e abandonar professores ao "desamparo" por não estarem preparados para lidar com alunos tão diferentes em uma mesma sala de aula. Alunos regulares que estudam em classes inclusivas, além disso, podem ter seu desempenho afetado – sem benefícios para o aluno incluído.

Fora dos "laboratórios" de pesquisa, relatos de famílias e consultas à população evidenciam que esse é um dilema real. Ouvidas pela Gazeta do Povo, famílias relatam, por exemplo, a dificuldade que seus filhos com limitações cognitivas têm para acompanhar o currículo de escolas regulares.

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Parcela significativa da população, além disso, segundo pesquisa do Datafolha de 2018, não prefere a educação inclusiva já que o modelo pode: 1) promover o baixo desempenho do aluno; 2) promover a desmotivação dos profissionais de educação, uma vez que eles não têm formação necessária para ensinar alunos com limitações; 3) atrasar o aprendizado dos outros alunos e 4) gerar efeito reverso de inclusão, promovendo maior preconceito.

"As evidências podem até apontar que a grande maioria se beneficia da inclusão, mas nem todos. E o resto? Será deixado para trás? Não importa se é 1%, esse é um direito à dignidade dele, e é tão grande quanto o de qualquer outro".

Lucelmo Lacerda

Mas ao impor a inclusão compulsória, a antiga PNEE não dava opção para alunos que não se beneficiavam no ensino comum. A nova política abre essa janela; as normativas que explicitarão os critérios de identificação, acolhimento e acompanhamento aos educandos que não se beneficiam com as classes regulares estão a cargo do CNE. Não há previsão de quando as diretrizes serão levadas a público.

"Se fixarmos em um polo ou outro, só na inclusão na escola regular ou na educação especial, estamos deixando muitos para trás. Temos que ampliar o leque. Com primazia no ensino regular, mas não podemos nos exaurir apenas nessa possibilidade", defende Elyse Matos, advogada, mãe de um menino com autismo e membro do Movimento Capricha na Inclusão.

"Quando algo traz sofrimento ao indivíduo, outras possibilidades têm que ser abertas. O ecossistema de ensino público tem que abranger a todos. Eu interpreto o lema de não deixar ninguém para trás como uma forma de também abrir possibilidades, sempre com prevalência e primazia da educação no ensino regular, pois é através da convivência que se eliminam as barreiras atitudinais".

Elyse Matos
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Especialistas, como a professora de pós-graduação em Educação Especial da UFSCar, Eniceia Gonçalves Mendes, discordam e veem a nova PNEE como retrocesso. Ela afirma que todos devem estudar por um currículo padrão, sem ressalvas. "Se a educação inclusiva não funciona, é por conta da falta de investimento, não porque o aluno seja incapaz de se beneficiar do ensino comum", defende.

"Se você o coloca em um ambiente separado, a escola vai continuar ruim".

Eniceia Mendes

Ainda segundo Eniceia, a nova política estimularia a volta da segregação social das pessoas com deficiência. Há dois principais temores: o de que as escolas regulares passem a negar a matrícula para esses estudantes e o de que as instituições de ensino especial se tornem filantrópicas e pratiquem a "desescolarização" dos alunos com deficiência, propondo baixas expectativas para o seu aprendizado.

No Congresso, iniciativas como a da deputada Sâmia Bonfim (Psol), PL 5352, visam assegurar que escolas que negarem matrícula a alunos com deficiência sejam punidas. O projeto também garantiria as adaptações necessárias aos alunos.

Ainda quanto à segregação, a especialista aponta que a inclusão na escola regular é o melhor ambiente para que os alunos com deficiência se socializem. Em caso de famílias que optem pela escola especial, seria necessário prover outros meios para a socialização, como cursos, clubes, participação em comunidades religiosas etc.

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Como será a partir de agora?

Escola regular: a inclusão na rede regular de ensino continua sendo a preferência para alunos com deficiência. Escolas não podem negar matrícula às famílias, sob pena de punição administrativa.

Nesse modelo, a escolha da família passa a ser valorizada, considerando o princípio da voluntariedade. As famílias não são mais obrigadas à matrícula compulsória na rede comum. A adesão é voluntária.

"Se os pais de um indivíduo que tenha a deficiência mais severa do mundo optarem por matriculá-lo na escola comum, esse direito continua absoluto", diz Lacerda. "Isso poderia estar mais claro na política, com a redação dispondo até sobre a punibilidade dos diretores que pressionarem a família para não matricularem".

Classe especial: classes especiais temporárias em escolas regulares podem ser criadas "sempre que houver educandos precisando de trabalho especializado, objetivando justamente seu máximo desenvolvimento", afirma o MEC. Na prática, essa medida nunca foi proibida, mas os Conselhos Estaduais dificultavam a regulamentação e órgãos pressionavam para que ambientes dessa natureza fossem fechados. Haverá destinação de recursos da União para a criação de salas de recursos multifuncionais e específicas.

As atividades desenvolvidas no atendimento educacional especializado não são substitutivas à escolarização. "Esse atendimento complementa e/ou suplementa a formação dos estudantes com vistas à autonomia e independência na escola e fora dela", diz o Ministério da Educação.

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Escola especial: entes federativos têm autonomia para abrir escolas e instituições especializadas para atender as singularidades dos alunos com deficiência.

"Queremos ver o público sendo atendido com dignidade. Se o estudante está em um contexto educacional no qual ele não está sendo beneficiado, está errado. Todo mundo tem que ter ganho com o processo educacional. Essa pessoa tem que ter plano de atendimento individualizado", diz Nídia de Sá, do MEC.

Para Elyse Matos, advogada e membro do movimento Capricha na Inclusão, não há impossibilidade de coexistência de diferentes modelos no sistema de ensino. O importante é que ele seja "bom e justo pra todos". "Não pode imputar sofrimento para muitos nem para alguns. Tem que contemplar todas as necessidades. Tendo escola especial, em caráter excepcional, atenderá aqueles que não lograram êxito na escola regular", diz.

Ela também acrescenta: "se para muitos, como no caso do meu filho, a educação na escola regular é o melhor ambiente, para muitos ela pode não ser e gerar sofrimento. Para esses indivíduos que o ambiente se tornou inóspito, tem que ter alternativas. Muitas vezes, deixar o aluno onde ele está, pode tolher a única chance que ele tem de melhorar nas suas pautas e ter autonomia e independência no futuro. Temos que ter olhar individualizado".

"As escolas especiais e as escolas bilíngues de surdos não são escolas 'irregulares', são escolas com respaldo legal e são oficializadas pelos Conselhos de Educação competentes para estes fins. Tais tipos de escolas encontram base legal na Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (1996), a qual prescreve, em seu artigo 58, que 'o atendimento educacional será feito em classes, escolas ou serviços especializados, sempre que, em função das condições específicas dos alunos, não for possível a sua integração nas classes comuns de ensino regular'"

Ministério da Educação
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Segregação e baixas expectativas

Especialistas apontam, contudo, ser imprescindível que escolas e classes especiais trabalhem baseadas nas melhores práticas e evidências sobre a educação especial. Por situações fatídicas já registradas na história, há o temor de que esses ambientes se tornem meros "depósitos de crianças" - o que é um risco real. A PNEE também parte de uma postura otimista de que a política de educação personalizada para crianças com necessidades especiais será prioridade para os governos locais.

A principal intenção do acompanhamento individualizado do aluno com deficiência é prepará-lo para voltar ou para chegar à classe regular. O que teria que regular a migração, porém, segundo Lacerda, seria o princípio da voluntariedade, e não sob uma diretriz autoritária, como foi feito nos últimos anos. "Para isso, primeiro é preciso legitimar a educação especial", diz ele, em referência à nova PNEE. Isso significa, portanto, que a educação especial não é algo oposto da educação inclusiva, mas faz parte desse "ecossistema".

"Não pode ser qualquer coisa. E deve haver fiscalização permanente do governo", destaca Lacerda. "Essa preocupação não é vazia, tem base na história do Brasil e no fato de que isso já aconteceu. Precisamos ir para a frente. Precisamos de um sistema no qual pessoas com necessidades complexas tenham acompanhamento de equipe multidisciplinar. Mas é possível ter uma equipe dessas em todas as escolas? Na prática, é preciso concentrar em algumas: e esse era o papel que escolas especiais desempenhavam".

"Sabe-se que o currículo tem que ser o mais individualizado possível. Mas é possível exigir, por exemplo, que uma professora administre 20 currículos diferentes em uma sala de aula?", questiona Haase.

Vitor Geraldi Haase

Mas, segregar totalmente alunos, em escolas e classes especiais, para atender suas singularidades, seria a melhor prática escolar? Especialistas tendem a dizer que não, com algumas exceções de casos mais severos. Há quem pense que o fato de estar em uma escola especial não anula a possibilidade de socialização, uma vez que é possível que o aluno frequente outros espaços.

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O MEC insiste que o objeitvo da política é ajudar, pessoalmente cada aluno, com recursos específicos, para que ele possa conviver com outros. "O atendimento educacional especializado tem como função identificar, elaborar e organizar recursos pedagógicos e de acessibilidade que eliminem as barreiras para a plena participação dos estudantes, considerando suas necessidades específicas", afirma o ministério.

Se der certo, será possível atender as crianças em suas necessidades específicas ao mesmo tempo em que são reintegradas às classes regulares.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]