Sistema de Defesa Aérea de Israel intercepta foguetes lançados de Gaza.| Foto: Reprodução/Twitter
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Na aclamada série A Casa de Papel, uma frase do carismático professor se destaca. Ao tentar convencer seus pupilos de que a população estaria do lado deles quando eles roubassem um banco, ele diz algo como “para quem vocês acham que o mundo torceria numa partida de Copa do Mundo: Brasil ou Camarões?” O consenso paira sobre Camarões.

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Deixando um pouco de lado o futebol, o que o professor disse faz muito sentido. O ser humano tem uma tendência natural a olhar para o lado mais fraco e torcer por ele. E isso é uma coisa boa. Essa simpatia não pode, contudo, ficar no caminho de uma moralidade comum que deveria servir de bússola para toda a humanidade. Vou me explicar. Quando um grupo terrorista, por exemplo, ataca de maneira indiscriminada civis de outro país, e infelizmente o número de mortes inocentes que se dá no país agressor é maior que no país atacado, isso é digno de lástima e tristeza. Agora, tirar essa ação de contexto sem apresentar todas as variáveis como se o país atacado fosse culpado por isso, bem, isso é fruto de desonestidade moral para dizer o mínimo. Refiro-me ao atual conflito entre Israel e os grupos terroristas Hamas e Jihad Islâmica, que comandam com punhos de aço a Faixa de Gaza.

A simpatia pelo mais fraco não pode ficar no caminho de uma moralidade comum que deveria servir de bússola para toda a humanidade

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Um contexto é necessário. O Hamas (e a Jihad Islâmica não é diferente) é um grupo que se autodenomina de resistência, mas essa resistência inclui a aberta e orgulhosamente proclamada destruição total de Israel. O grupo vai além e visa também o domínio de Roma, a capital dos católicos ou “cruzados” (em suas próprias palavras), e a partir dela a conquista de toda a Europa, das duas Américas e do Leste Europeu. Isso foi dito em um sermão que foi ao ar na TV Al-Aqsa, do Hamas, em 11 de abril de 2008, segundo a organização Memri. Não fosse suficiente o desejo expansionista mundial e a adesão ao fanatismo religioso que conduz o modus operandi do grupo, muitos analistas insistem em ocultar esses lados da organização e simplesmente dar um tom de legitimidade ao grupo ao ressaltá-lo como ativista, representante do povo palestino.

É bem verdade que eles foram eleitos em 2006 na Faixa de Gaza, mas é também verdade que eles expulsaram dessa faixa de terra outro grupo que também representa os palestinos – o partido político Fatah (que hoje governa partes da Cisjordânia). Não só isso como rejeitam absolutamente qualquer busca pela paz, sufocando e acusando judicialmente dissidentes que tentam estabelecer qualquer tipo de diálogo com Israel, como ocorreu com jovens em setembro de 2020 ao tentar comunicar-se com israelenses via Skype, “enfraquecendo o espírito da revolução”. Sua carta fundadora afirma que o “Jihad é o caminho e morte por amor de Allah[sendo] o mais elevado de seus desejos” e “Israel existirá e continuará a existir até que o Islã o destrua, da mesma forma que obliterou outros antes dele”. Esses são respectivamente os artigos 8.º e 13 da carta do grupo, considerado terrorista pelos EUA, União Europeia e outros países.

O Hamas e a Jihad Islâmica vêm lançando, nos últimos dias, centenas de mísseis contra civis em Israel, que responde cirurgicamente atacando a infraestrutura dos grupos e eliminando seus líderes terroristas. Isso se dá através de aviso prévio de evacuação de prédios em Gaza para que civis inocentes não sofram o parto. A morte de civis inocentes, mesmo assim, infelizmente ocorre – muito em face dos mísseis dos grupos terroristas que caem em seu próprio território.

O contexto que levou a esse conflito varia muito de boca para boca. Há alguns dias, jovens palestinos atacaram judeus ortodoxos e registraram o ocorrido em redes sociais. Isso gerou atenção nacional e rapidamente provocou uma reação de jovens judeus, que também atacaram e hostilizaram árabes que moram em Israel. Em outro momento, o atual presidente da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas, vergonhosamente cancelou as primeiras eleições palestinas em mais de 15 anos na Cisjordânia numa tentativa de se manter no poder em face de sua grande impopularidade. Usou como justificativa a não permissão de árabes que moram na parte oriental da cidade de Jerusalém como eleitores, o que foi repudiado como desculpa esfarrapada por diversos analistas sérios. Os grupos terroristas em Gaza, cientes da agitação e insatisfação dos palestinos da Cisjordânia e cientes do completo enfraquecimento de Abbas como líder legítimo, se aproveitaram da situação e quiseram mostrar que estão de fato no controle (ao bombardear Israel, isso foi dado como sinal de força) e são os representantes autênticos nos quais os palestinos podem depositar suas esperanças. Somado a tudo isso, ainda houve uma disputa judicial por propriedades imobiliárias entre famílias israelenses e palestinas que rapidamente ganhou tons políticos e foi usada como arma para alimentar ainda mais as tensões entre os lados.

Pelo menos dois acordos de paz recentes extremamente sérios envolvendo a saída de Israel de mais de 90% dos territórios da Cisjordânia foram simplesmente recusados pela liderança palestina

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Nada disso, porém, justifica a busca pela eliminação de Israel sob a forma constante de mísseis, cuja ameaça seria ainda mais séria se não pelo sofisticado aparato de segurança israelense. Muitos, porém, vão além e argumentam, sempre com sutileza e astúcia, sob o manto dos direitos humanos e opressões sofridas pelos palestinos pela ocupação de Israel nos territórios supostamente seus, que sim, isso é justificável. O que os palestinos podem fazer em face da opressão se não reagir?

Esquecendo o fato de que pelo menos dois acordos de paz recentes extremamente sérios envolvendo a saída de Israel de mais de 90% dos territórios da Cisjordânia foram simplesmente recusados pela liderança palestina, a realidade da vida dos palestinos em Gaza e na Cisjordânia não é tão ruim assim em comparação com outros casos no mundo. Segundo relatório do professor Efraim Karsh, do King’s College de Londres, a expectativa de vida dos palestinos na Cisjordânia e Gaza era de 48 anos em 1967 e aumentou para 72 anos em 2000. É esse o indício da “opressão” israelense sofrida por eles? A mortalidade infantil dos palestinos também decaiu consideravelmente dos anos 1960 até 2016, segundo o Banco Mundial.

Hamas e Jihad Islâmica rejeitam absolutamente qualquer busca pela paz, sufocando e acusando judicialmente dissidentes que tentam estabelecer qualquer tipo de diálogo com Israel

As reações internacionais frente à atitude israelense de autodefesa escondem agendas políticas e equiparam Israel a grupos que promovem ódio e em nada têm a ver com os valores ocidentais mais decentes de prosperidade e igualdade almejados. Israel quer viver. É chegada a hora de as vozes da mentira que manipulam os fatos e a realidade saírem por iniciativa própria de cena ou mudarem firmemente de postura. A verdade precisa prevalecer, por mais cinzento que seja o cenário. Diferentemente da série A Casa de Papel, nós precisamos deixar às vezes de lado nosso instinto protetor pelos supostamente oprimidos para analisar honestamente cada caso, entendendo o máximo de nuances possível. Isso permitirá um viés mais crítico e amplo de cada situação e uma análise mais sincera.

Felipe Camlot, graduado em Relações Internacionais e mestre em Direito Internacional e Resolução de Conflitos pela Universidade Hebraica de Jerusalém, é membro do Conselho Acadêmico da StandWithUs Brasil.

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Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]