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Sessão Congresso Nacional
Derrubada de vetos presidenciais e de portarias de ministérios estão na lista das derrotas acumuladas pelo governo no Congresso no fim do ano legislativo.| Foto: Zeca Ribeiro / Câmara dos Deputados

O encerramento do ano legislativo se desenha desfavorável para o governo, que vislumbra uma série de derrotas em votações nos próximos dias. O Congresso avança em diversas iniciativas que contrariam planos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), além de impor incertezas sobre o destino de outros projetos. A queda de vetos presidenciais e a revisão de portarias ministeriais, juntamente com a ressurreição de propostas rejeitadas pela atual administração e a imposição de novas despesas, consolidam uma maior autonomia do Legislativo.

Tanto o Senado quanto a Câmara fortalecem a posição de independência, com agenda própria e controle crescente sobre os recursos federais. Nesse cenário, a derrota mais sentida pelo governo imposta pelos parlamentares envolve as definições do Orçamento da União para 2024. O relator da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), deputado Danilo Forte (União-CE), confirmou a fixação de cronograma de pagamentos obrigatórios de emendas parlamentares, restringindo o poder de barganha do Planalto.

“Ficamos muito à mercê do governo de plantão das liberações das emendas que muitas vezes funcionam como moeda de troca nas votações”, disse o relator da LDO na terça-feira (21), durante reunião da Frente Parlamentar de Empreendedorismo (FPE).

Segundo Danilo Forte, o valor reservado às emendas individuais será de R$ 25,1 bilhões, além dos R$ 12,5 bilhões para as de bancada. Ele informou ainda que avalia tirar recursos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) para engordar o fundo de financiamento das campanhas eleitorais. O governo propôs R$ 939,2 milhões e os partidos querem ao menos repetir os R$ 4,9 bilhões do último pleito.

Em outra prova de fraqueza do governo diante do Congresso, deputados se organizaram para pautar a derrubada da norma que exige anuência dos sindicatos nos acordos que permitem trabalho no comércio aos domingos e feriados deverá ser pautada.

Foram registrados 20 projetos de decreto legislativo (PDL) para suspender a portaria do Ministério do Trabalho, editada semana passada. Na noite da terça-feira (21), com o apoio de 301 deputados, foi aprovado o regime de urgência para votar o PDL de Luiz Gastão (PSD-CE). O texto seria votado diretamente no plenário, sem precisar passar pelas comissões. Mas, com medo de derrota, o governo Lula revogou a portaria e pautou uma nova investida sobre o assunto para 2024.

Ainda no campo do combate do Congresso ao revisionismo da gestão petista em relação às iniciativas para modernizar as regras do mercado de trabalho, o plenário da Câmara aprovou também na noite de terça-feira (21), com 286 votos favoráveis, o projeto de lei que flexibiliza a contratação de jovens e idosos nos moldes da “Carteira Verde a Amarela” proposta pelo governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

O projeto, que deve ser vetado pelo presidente Lula (PT), caso seja aprovado pelo Senado em seguida, oferece benefícios às empresas que contratarem pessoas de 18 a 29 anos que nunca tiveram vínculos formais de emprego ou pessoas acima de 50 anos que estejam fora do mercado de trabalho e não tenham tido vínculo empregatício formal nos 12 meses anteriores à contratação.

Governo já espera a derrubada de seus vetos ao marco temporal

Além das derrotas na LDO e na área trabalhista, o governo deverá sofrer um golpe com a análise de vetos presidenciais pela sessão do Congresso, marcada para esta quinta-feira (23). Os articuladores do Planalto já contam com a derrubada dos vetos ao marco temporal para demarcação de terras indígenas, deixando a questão ser novamente avaliada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Enquanto isso, os governistas lutam para manter os vetos do projeto do arcabouço fiscal e da nova governança para o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). Esses dois vetos são tidos como prioritários para a pauta econômica do governo.

Um dos trechos do arcabouço fiscal vetado por Lula, que substituiu o teto de gastos e foi aprovado pelo Congresso, impedia o governo de tirar “quaisquer despesas” do cálculo da meta estipulada para as contas públicas. “Há chance desse veto ser derrubado pelo Congresso”, avisou o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), ainda em setembro.

Os muitos reveses sofridos pelos líderes do governo na Câmara e no Senado, e pelo ministro das relações institucionais, Alexandre Padilha, estão pressionando o Planalto para reorganizar a sua estratégia no Congresso. “O modelo do governo de se relacionar com o Congresso está com dificuldades. Não se pode esquecer nunca que é preciso convencer e que isso vale até para o Planalto”, observa o cientista político Leonardo Barreto, da consultoria Vector Relações Governamentais e Institucionais.

No Senado, a reprovação do nome indicado por Lula para comandar a Defensoria Pública da União e a vitória apertada na votação da reforma tributária são exemplos de que é necessário investir em convencimento. Até mesmo a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 8/2021, que limita os poderes individuais dos ministros do STF, é vista como sinal da fraqueza da articulação.

Além disso, outro sinal que reforça essa impressão negativa para o governo veio da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado na terça-feira (21), que adiou a votação de dois projetos para aumentar a arrecadação da União em 2024. Os projetos que mudam a tributação da alta renda, em fundos de investimento no exterior (offshore) e exclusivos, e o mercado de apostas esportivas, foram só aprovados na manhã da quarta-feira (22).

Congresso firma nova dinâmica na sua relação com o governo

Na visão de João Henrique Hummel Vieira, diretor da consultoria Action Relações Governamentais, a reforma tributária obteve aprovação no Senado por uma estreita margem de votos favoráveis, não apenas devido ao seu conteúdo, mas também em decorrência das novas relações estabelecidas entre os poderes Executivo e Legislativo. “Agora, a expectativa recai sobre a Câmara e o Senado, que devem ratificar a proposta, marcando o feito significativo do Congresso diante da sociedade”, disse. Segundo o cientista político, esse esforço reflete uma nova realidade conceitual.

O principal foco das negociações do governo com o Congresso gira em torno sobretudo da LDO, cuja decisão irá determinar a presença ou ausência de déficit das contas públicas. “Alcançar déficit zero com o pagamento de emendas parlamentares é desafio crucial e o grande acordo buscado, sobretudo em ano eleitoral. E isso está condicionado às fontes viáveis para garantir o financiamento dessas emendas”, disse. A concretização desse cenário pode transcender não apenas o pacote arrecadatório, mas também envolver a racionalização de despesas. “A nova dinâmica na correlação de forças parece indicar amadurecimento do sistema democrático, agora mais vinculado a compromissos concretos e resultados palpáveis”, observou Vieira.

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