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O ministro Nelson Teich em sua posse, em 16/04/2020
O ministro Nelson Teich em sua posse, em 16/04/2020| Foto: Carolina Antunes/PR

O médico oncologista Nelson Teich foi confirmado nesta quinta-feira (16) como novo Ministro da Saúde. Sua indicação encerrou uma novela que se arrastava há algumas semanas, a do desgaste do então titular da pasta, Luiz Henrique Mandetta.

O agora ex-ministro entrou em rota de colisão com o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) por divergências na visão do combate à pandemia de coronavírus. O que começou como manifestação discreta de opiniões divergentes evoluiu para troca pública de farpas e acabou com a exoneração.

Apesar das frases ácidas trocadas entre Bolsonaro e Mandetta, as palavras do presidente sobre o ex-ministro nesta quinta seguiram outro tom. "[Foi] uma conversa bastante produtiva, muito cordial, onde nós selamos um ciclo do Ministério da Saúde. Ele [Mandetta] se prontificou a participar de uma transição mais tranquila possível com maior riqueza de detalhes que se possa oferecer", declarou o presidente da República, durante a cerimônia de posse de Teich, no Palácio do Planalto.

A menção de Bolsonaro a uma transição "mais tranquila possível" é um indicativo de um potencial rumo que o Ministério pode tomar sob o comando de Teich. Apesar de o novo ministro ter declarado que tem "alinhamento completo" com Bolsonaro, algumas de suas visões sobre o combate ao coronavírus são similares às de Mandetta – e que contribuíram para o rompimento entre o ex-ministro e o presidente da República.

Teich: sem cloroquina e sem polarização

O discurso de Teich durante a cerimônia de posse não conteve nenhuma menção à cloroquina e à hidroxicloroquina, substâncias que o presidente Bolsonaro tem mencionado como alternativas para o tratamento da Covid-19, mesmo sem consenso da comunidade científica. A defesa dos medicamentos foi o que havia fortalecido outros nomes na "bolsa de apostas" para o cargo de Mandetta, como o da médica paulista Nise Yamaguchi.

Também em sua fala, Teich rejeitou a existência de uma polarização entre a preservação de empregos e a defesa da saúde. Ele, assim, reforçou posicionamento que expôs em artigo publicado no início do mês, antes de ser considerado para o comando do Ministério.

"Essas coisas [economia e saúde] não competem entre si. Elas são completamente complementares. Quando você polariza uma coisa dessas, você começa a tratar como se fosse pessoas versus dinheiro, o bem versus o mal, empregos versus pessoas doentes. E não é nada disso", afirmou.

Equipe é dúvida

Em entrevista ao SBT pouco após a cerimônia de posse, Teich declarou que ainda não definiu a sua equipe no Ministério da Saúde. "Estou chegando agora, isso foi feito agora à tarde. Então, eu vou sentar, vou ver a equipe, vou ver as pessoas, vou sentar com o Ministério, vou sentar com o presidente, e a gente vai decidir", disse.

Este aspecto poderá representar uma das principais diferenças dos trabalhos de Mandetta e Teich. A equipe formada pelo ex-ministro ganhou notoriedade durante as últimas semanas, por conta das entrevistas coletivas em que atualizava os números do coronavírus no Brasil.

E a entrevista da quarta-feira (15), em que Mandetta e seus então subordinados falaram em tom de despedida, contou com muitos discursos que buscaram passar uma imagem de unidade no time. Em uma dessas falas, o secretário-executivo da pasta, João Gabbardo, rejeitou a ideia de se tornar ministro - o nome dele havia ganhado força no início da semana, como uma "solução caseira" para a exoneração de Mandetta. Gabbardo disse que deixaria o posto junto com Mandetta.

Ainda antes da coletiva, o dia viu o impasse em torno do pedido de demissão de Wanderson Oliveira, secretário de Vigilância em Saúde. Ele solicitou o desligamento, o Ministério confirmou a requisição, mas posteriormente o pedido foi recusado por Mandetta. Wanderson acabaria participando da coletiva, onde também reforçaria seus laços de parceria com o agora ex-ministro.

Teich também não deve contar com os ex-deputados federais Abelardo Lupion e José Carlos Aleluia. Ambos chegaram ao Ministério da Saúde junto com Mandetta e atuavam na pasta, desde então, como articuladores – e até mesmo "bombeiros", por se apresentarem simultaneamente como amigos de Bolsonaro e do ex-ministro. Lupion confirmou à Gazeta do Povo que sairá do Ministério. Aleluia não respondeu à reportagem.

Impactos políticos

Fora do campo de ação do Ministério da Saúde, a chegada de Teich pode representar um novo estágio na relação entre o presidente Bolsonaro e a classe política. Mandetta é ex-deputado federal e integra o DEM, partido de dois ministros (Onyx Lorenzoni, da Cidadania, e Tereza Cristina, da Agricultura) e dos presidentes de Câmara, Rodrigo Maia, e Senado, Davi Alcolumbre. Já Teich não tem filiação partidária e jamais disputou uma eleição.

A exoneração de Mandetta motivou críticas que não ficaram restritas a adversários do governo Bolsonaro. O DEM publicou nota oficial, assinada pelo seu presidente, o prefeito de Salvador, ACM Neto, chamando a atuação de Mandetta de "trabalho exemplar". Na mesma linha, o PSDB, também via nota oficial, chamou a decisão de "movimento temerário".

Contestações vieram de antigos aliados de Bolsonaro, como o senador Major Olímpio (PSL-SP). O parlamentar também celebrou o trabalho de Mandetta e recordou que Teich tem visões similares à do ex-ministro. Para Olímpio, ou Teich mudará de posicionamento, ou não ficará "30 dias" no comando do Ministério.

Uma das manifestações mais incisivas veio de Alcolumbre e Maia. Em texto assinado por ambos, com o teor de "nota oficial do Congresso Nacional", os parlamentares dispararam: " O trabalho responsável e dedicado do ministro foi irreparável. A sua saída, para o País como um todo, nesse grave momento, certamente não é positiva e será sentida por todos nós. A maioria das brasileiras e dos brasileiros espera que o presidente Jair Bolsonaro não tenha demitido Mandetta com o intuito de insistir numa postura que prejudica a necessidade do distanciamento social e estimula um falso conflito entre saúde e economia".

A temperatura do relacionamento entre Maia e Bolsonaro se elevaria ainda mais na noite de quinta, quando o presidente, em entrevista à CNN Brasil, foi incisivo contra o deputado. "O Brasil, quero deixar bem claro, não merece o que o senhor Rodrigo Maia está fazendo. O Brasil não merece a atuação dele dentro da Câmara. Não é o Parlamento brasileiro, é a atuação dele. Rodrigo Maia, péssima a sua atuação. Quando você fala em diálogo, a gente sabe qual é o teu diálogo, então esse tipo de diálogo não vai ter comigo", falou.

Maia concedeu entrevista ao mesmo canal na sequência e disse que não responderia a Bolsonaro, mas voltou a elogiar o trabalho de Mandetta e disse que a Câmara tem aprovado medidas de interesse do governo.

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