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Magistrados do Supremo Tribunal Federal (STF), Superior Tribunal de Justiça (STJ), Tribunal Superior do Trabalho (TST), Tribunal de Contas da União (TCU) e de tribunais regionais ganharam até R$ 50 mil por hora em palestras.
As informações constam em um levantamento feito pelo jornal O Estado de São Paulo e divulgado neste domingo (1).
O Estadão mapeou cachês recebidos por 10 magistrados em 17 palestras realizadas por entidades empresariais em órgãos públicos, de junho de 2021 até agosto de 2024.
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Por vezes, os pagamentos dos cachês foram feitos por empresas criadas pelos próprios magistrados.
Como as empresas privadas envolvidas não têm obrigação de dar transparência aos pagamentos, o Estadão estima que o “mercado de palestras” pode ser maior do que o revelado no levantamento.
Informações sobre os eventos e pagamentos feitos por organizações e conselhos aos magistrados foram obtidas através da Lei de Acesso à Informação (LAI) e de relatos dos próprios magistrados e empresários.
São citados na reportagem os magistrados:
- João Carlos Mayer Soares, do TRF-1, que recebeu R$ 72,5 mil por 4 palestras;
- Luis Felipe Salomão, do STJ, que recebeu R$ 52,2 mil por duas palestras;
- André Mendonça, do STF, que recebeu R$ 50 mil por uma palestra;
- Paulo dias de Moura Ribeiro, do STJ, que recebeu R$ 45 mil por duas palestras;
- Marco Buzzi, do STJ, que recebeu R$ 40 mil, por duas palestras;
- Douglas Alencar Rodrigues, do TST, que recebeu R$ 33 mil por duas palestras;
- Benjamin Zymler, do TCU, que recebeu R$ 30 mil por uma palestra;
- Reynaldo Fonseca, do STJ, que recebeu R$ 20 mil por uma palestra;
- Antonio Saldanha Palheiro, do STJ, que recebeu R$ 10 mil por uma palestra e;
- Rogério Favreto, do TRF-4, que recebeu R$ 12 mil por uma palestra.
Alguns dos magistrados citados tiveram o pagamento do cachê intermediado por empresas das quais são sócios.
Regra do CNJ contraria Constituição Federal sobre prática
De acordo com a Constituição Federal (CF), os magistrados são proibidos de exercerem qualquer função à exceção da ministração de aulas. A regra tem como objetivo evitar conflitos de interesses.
Na contramão da Constituição, a Lei Orgânica da Magistratura (Loman) permite aos juízes, desembargadores e ministros manterem atividades empresariais, desde que na condição de sócios cotistas e não administradores das empresas.
Em 2016, sob a presidência do atual ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) equiparou a realização de palestras à atividade de professor, o que abriu brecha para a escalada da prática.
Na mesma decisão, o CNJ determinou que os juízes tornassem públicas as informações sobre as atividades extras.
Em 2021, porém, o presidente do CNJ na época, Luiz Fux, derrubou as regras que exigiam transparência e manteve a permissão para realização de palestras.
Apesar da permissão, ainda está vigente uma norma do CNJ, de 2013, que “proíbe os magistrados de receber, a qualquer título ou pretexto, prêmios, auxílios ou contribuições de pessoas físicas, entidades públicas ou privadas”.
Em 2013, o presidente do CNJ era o ministro aposentado do STF, Joaquim Barbosa.
Embate no CNJ
Ano passado, o então conselheiro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho apresentou uma proposta ao CNJ para proibir o recebimento de presentes que ultrapassem os R$ 100; impedir o pagamento por palestras a magistrados; e obrigar magistrados a divulgar anualmente as variações patrimoniais superiores a 40%.
Ainda, segundo a proposta, os juízes deveriam tornar públicas as suas agendas.
A proposta foi rejeitada por oito votos a seis e teve a oposição liderada pelo então presidente do CNJ, Luis Felipe Salomão.
O que dizem os Tribunais e os contratantes
Procurado pela reportagem, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), onde trabalha o desembargador Carlos Mayer Soares, afirmou que “a Constituição Federal e a Lei Orgânica da Magistratura Nacional não proíbem o exercício da atividade docente por parte dos magistrados, incluindo a realização de palestras, mesmo quando remuneradas, especialmente quando estas são dirigidas a instituições que integram a Administração Pública”.
O TRF-4, onde trabalha o desembargador Rogério Favreto, disse que “a legislação federal também permite ao magistrado proferir palestras, mesmo que remuneradas, tanto para entidades públicas, quanto privadas” e que “a atuação acadêmica não se confunde com a atividade jurisdicional”.
Os organizadores dos eventos que tiveram os magistrados como palestrantes disseram que as contratações foram feitas seguindo a legislação vigente.
Procurado pela Gazeta do Povo, nesta segunda-feira (2), o TCU disse que "segundo a Constituição, os ministros do Tribunal de Contas da União possuem as mesmas prerrogativas e se sujeitam às mesmas vedações dos ministros do STJ (art. 73, § 3º), incidindo, portanto, a autorização para o magistério (art. 95, parágrafo único, inciso I)".
À Gazeta, a assessoria de comunicação do STF disse que o Tribunal não irá comentar sobre o caso.
A Gazeta do Povo também entrou em contato com o STJ e TST para comentar sobre o levantamento e aguarda retorno.
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