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Sorriso à Beira-mar
| Foto: Bigstock

Lembro que em 2014, por aí, assisti a uma apresentação do Jeff Tweedy, vocalista do Wilco, acompanhado apenas do seu filho, Spencer, com quem lançou um disco. Lembro de desejar um dia fazer algo assim com os meus. O caçula certamente seria o baterista e o mais velho o baixista cool, sempre de óculos escuros. Já eu, bom, não parecendo o Elton John já me daria por satisfeito.

Penso nisso enquanto acompanho meu caçula brincando no mar, crescido demais, embora não tanto ainda quanto o irmão mais velho, ainda dormindo em casa. É quase meio-dia e os versos de Wait For Love sopram em meus ouvidos: "Ouvi você dizer que sonhos não importam / Mas é como suportamos enquanto os dias passam / E esperamos pelo amor”.

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Em 2014, qualquer coisa de pai-com-filho, pai-para-filho e vice-versa, me fazia prestar atenção. Uma das consequências do luto pela perda de meu pai no fim de 2013. Foi quando conheci a história de Warren Zevon. Não faz ideia de quem seja? Entendo, e se não fosse por David Letterman, o famoso apresentador de um talk show americano durante décadas, dificilmente eu e milhares de outros o teriam conhecido.

Como Eddie Vedder, vocalista do Pearl Jam, que também só o conheceu de tanto que o apresentador convidava o músico para seu programa. Porque gostava dele, como músico, como convidado, como pessoa. A última vez que participou recebeu uma homenagem especial. Foi em outubro de 2002, pouco depois de Warren ter descoberto um câncer de pulmão incurável.

Recentemente, o canal de Letterman no YouTube disponibilizou a entrevista, em que ambos falam abertamente sobre a morte próxima, com o sarcasmo que lhes era característico, mas tendo nos silêncios entre as falas uma tristeza palpável e comovente. Gosto de lembrar dessa história, que associo a uma fala do papa Francisco: "Um amigo me chamou pra cuidar da dor dele, guardei a minha no bolso. E fui.”

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"Entrei com padre Pio no pequeno parlatório e, quando nos sentamos, eu disse:

- E assim, padre, perdemos nosso velho amigo.

Ele concordou com a cabeça, sem proferir uma palavra, e lágrimas rolavam por sua face.

- Mas, padre, o senhor sabe que ele partiu para receber sua grande recompensa - continuei.

- Ah, sim - ele disse -, sem dúvida! Mas você sabe que não somente a mente mas também o coração do homem quer a sua parte.

Recordei-me de quando Cristo chorou por Lázaro e de quando os presentes tinham dito: 'Vejam como Ele o amava'. Padre Pio olhou-me, ainda amargurado por aquele tremendo vazio, e disse:

- Você nunca pensou em encontrar padre Pio nestas condições.

- Agora - respondi -, se possível, respeito padre Pio ainda mais, porque o vejo na sua fragilidade humana.

Ele sacudiu a cabeça, inconsolável."

Trecho de "Padre Pio - Histórias e Memórias", de John McCaffery.

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Warren Zevon morreria em setembro de 2003. Duas semanas antes lançou seu último disco, com as letras falando sobre sua partida, sobre quem era, sobre o amor ainda vivo por sua ex-esposa. A última música gravada e que encerra o disco, propositalmente, chama-se  Keep me in your heart for a while, na qual canta pedindo que o guardem em seu coração por um tempo.

Fui procurar o clipe da música, que é uma homenagem a Warren. Não encontrei com boa qualidade, apenas uma versão piorada. Por curiosidade, li os comentários do vídeo e o primeiro deles era de um senhor de 68 anos que lutava contra um câncer também, dedicando a música aos que fizeram parte da vida dele.

O post foi há dois anos atrás e há mais de 100 respostas ao comentário, todas desejando melhoras, força, apoiando. Mesmo depois de avisarem de sua morte, os comentários não pararam, guardando aquele senhor no coração. Um deles escreveu, há 3 meses atrás: “Você provavelmente já se foi agora, mas toquei essa música no funeral do meu pai e pensei em você”.

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O caçula cansou, sugiro tomarmos um sorvete, se esconder um pouco do sol. Lembro de quando eu era o filho e meu pai o que sugeria sorvetes. Meu verso preferido da música final de Zevon é: "Às vezes, quando você estiver fazendo coisas simples pela casa / Talvez você se lembre de mim e sorrirá”. E é assim mesmo, mas sem talvez, só sorrisos.

Conteúdo editado por:Jônatas Dias Lima
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